ambiente legal
13
Generosidade. Foi o que não faltou à Mãe Na-
tureza ao nos oferecer água em abundância. São
mais de 200 mil bacias hidrográficas espalhadas
pelo País. Dispomos de aproximadamente 12%
de toda água doce do planeta. Tudo isso coroado
por um clima úmido que facilita as chuvas e a
manutenção do ciclo hidrológico. Mas é preciso
admitir: temos sido pouco responsáveis ao zelar
por esse bem. O precioso e vital líquido foi tão
maltratado ao longo de décadas que se tornou
raro. E caro.
Colocar um preço para o uso da água é justa-
mente um dos caminhos existentes para ameni-
zar o atual quadro de escassez e poluição, o que
é alvo de consenso entre especialistas. Em águas
européias, há mais de 30 anos esse instrumento é
adotado. Em 1964, a França criou a Lei da Água.
A legislação permitiu a criação dos comitês de
bacia. O País foi dividido em seis bacias. Hoje,
só a Bacia do Siena-Normandie arrecada US$
1
bilhão por ano. Holanda, Alemanha, Chile e
México também são países com experiência em
cobrança.
A cobrança é imprescindível”, afirma o de-
putado federal Antonio Carlos Mendes Thame
(
PSDB-SP), especialista em recursos hídricos e
autor de livros sobre o tema. Na sua avaliação,
mais do que arrecadar dinheiro, o importante é
modificar comportamentos”. E essas mudanças,
na ótica do deputado federal, vão induzir ao uso
racional da água.
Recente diagnóstico do Plano Nacional de
Recursos Hídricos aponta que cinco das 12 re-
giões hidrográficas brasileiras estão em situação
preocupante, crítica ou muito crítica no que se
refere à escassez (
veja ilustração à pág. 15
).
Quan-
to à poluição, 90% dos esgotos domésticos e 70%
dos efluentes industriais são lançados nos corpos
d’água, segundo a Companhia de Saneamento
Básico do Estado de São Paulo (CETESB).
A Agência Nacional de Águas (ANA) informa
que, ao todo, 24 estados e o Distrito Federal já
aprovaram leis sobre a política de gerenciamen-
to de recursos hídricos. Em todas elas a cobrança
está prevista. Os estados que já dispõem desse sis-
tema são: Ceará, Minas Gerais, Rio de Janeiro e
São Paulo. Neste último, a Assembléia Legislativa
aprovou a cobrança recentemente, porém, a lei
ainda está em processo de regulamentação.
Quem paga a conta?
-
Mas quem deve pagar
o preço pelo uso da água para que a situação de
escassez, poluição e mau uso seja revertida? Todos
nós. É o que afirmam os estudiosos. A resposta
parece simples. Entretanto, suscita perguntas
complexas. Quem deve arcar com os custos mais
elevados? Quem pode pagar menos? Quem está
isento ou merece compensação? E a questão mais
difícil: quanto deve custar o metro cúbico dessa
riqueza natural?
As respostas para essas questões já foram res-
pondidas ou estão sendo buscadas nos comitês
de bacia. São eles que definem e estabelecem a
cobrança pelo uso da água em suas regiões. É im-
portante não confundir essa cobrança – estabele-
cida pelos comitês – com as que os consumidores
domésticos ou industriais já pagam às concessio-
nárias locais. Essas contas mensais têm como base
de cálculo a captação, distribuição e o transpor-
te da água. O sistema de cobrança pelo uso da
água definido nos comitês de bacias é muito mais
amplo. E tem alvos certos: grandes consumidores
como indústrias, empresas públicas e privadas de
saneamento e a agricultura.
Garantia legal
-
As decisões tomadas nos co-
mitês de bacia têm amparo legal. “A lei nacional
descentraliza o poder de decisão que fica nas mãos
dos comitês de bacia”, explica Wilde Cardoso
Gontijo Júnior, especialista em Recursos Hídri-
cos e assessor de diretoria da ANA. Em todo o
País são cerca de 300 bacias com potencial para
abrigar comitês, nos quais todos os atores sociais
interessados têm voz e voto. Participam das de-
cisões dessas instâncias representantes do Poder
Público, empresas, universidades e organizações
da sociedade civil.
A garantia da cobrança está na Lei Federal
9.433/97
que estabeleceu a Política Nacional de
Recursos Hídricos. O artigo 19 determina que
a água é um bem econômico sujeito à cobrança,
considerada um instrumento de gestão e não de
mera arrecadação.
A partir disso, os comitês de bacia ganharam
poderes para definir como e quem deve pagar pela
água. Os grandes consumidores, a exemplo da in-
dústria, agricultura e concessionários de serviço
de água e esgoto, que usam de rios e mananciais
públicos para tocar seus negócios, terão de colocar
a mão no bolso, o que põe em prática o principio
usuário-pagador previsto na legislação brasileira.
E também aqueles que utilizam o líquido sem
a preocupação de reparar os danos causados ao
meio ambiente, como as empresas que poluem a