fevereiro de 2003
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co, no seu código de águas, estabeleceu
a “Norma Oficial Mexicana”, em 1977,
tratando dos limites máximos permis-
síveis de contaminantes para águas re-
siduárias tratadas, que sejam reusadas
em serviços públicos. E, por fim, a Es-
panha estabeleceu, no seu Plano
Hidrológico Nacional, normas para reu-
tilização de águas residuárias.
Contudo, apesar desta lacuna legal,
o fato é que o reúso de águas residuárias,
ainda que embrionariamente, já é uma
realidade no Brasil, muito embora não
existam dados que permitam um diag-
nóstico preciso sobre a matéria no país.
Faltam informações sobre volume total
reutilizado, qualidade das águas reusa-
das, aspectos econômicos e financeiros,
aspectos sanitários e epidemiológicos,
aspectos sociais, de saúde pública e de
participação pública, tipologias de reú-
so e tecnologias e padrões a serem ado-
tados, em nível nacional. Como afirma
Eudemberg, “Tudo isso ainda é um so-
nho dos gestores, especialistas e consul-
tores no assunto”.
A cobrança pelo uso da água, pre-
vista pela Lei da Política Nacional dos
Recursos Hídricos, bem como a imple-
mentação de políticas de reúso da água
para fins menos nobres, visando dis-
ponibilizar água bruta para abastecimen-
to humano, entre outros fins essenciais,
são práticas que se impõem, especial-
mente pelo fato de a água ser um recur-
so finito.
O reúso na prática
O reúso de águas pode ocorrer de
forma direta ou indireta. O direto ocorre
quando o líquido passa por processos de
tratamento, acondicionamento e distri-
buição, visando especificamente à sua
reutilização. A irrigação, aqüicultura,
abastecimento industrial e abastecimen-
to humano, são exemplos desse tipo de
reúso.
O indireto refere-se àquele sistema
cujo esgoto é lançado no ambiente
(
águas superficiais e subterrâneas), passa
por processo de diluição, dispersão e
depuração, voltando a ser utilizado. A
recarga de aqüíferos, lançamento de cor-
pos hídricos superficiais e a regulariza-
ção de cursos d’água são exemplos des-
sa modalidade.
Além do setor industrial, o reúso
também é alternativa que pode ser ado-
tada por outros setores da economia e
para inúmeras finalidades. Contudo, há
que se observar que o nível de qualidade
da água que se quer reusar deve estar
compatível com cada uma das finali-
dades: irrigação paisagística, irrigação
de campos de cultivo, usos industriais,
recarga de aqüíferos, usos urbanos não
potáveis, finalidades ambientais e usos
diversos (aqüicultura, construções, con-
trole de poeira e dessedentação de ani-
mais).
O engenheiro Eudemberg lembra o
exemplo da Companhia de Saneamento
Básico do Estado de São Paulo - SA-
BESP, para a qual o fornecimento de
água de reúso já é uma realidade. Ele
faz referência ao projeto da fábrica de
Linhas Correntes, que utiliza a água pro-
veniente do esgoto tratado pela empre-
sa de saneamento, para lavagem e tingi-
mento de seus produtos. Outros exem-
plos são os da Prefeitura de São Cae-
tano do Sul, que utiliza água tratada pela
Estação de Tratamento de Esgotos do
ABC para rega de jardins e lavagem de
ruas após realização das feiras livres, e
das prefeituras de Barueri e Carapicuíba.
Algumas empresas construtoras também
estão utilizando este produto para o as-
sentamento de pó em canteiros de obras.
A empresa de saneamento do Esta-
do de São Paulo informa, em seu site,
que sua política de venda de água reci-
clada está coerente com o programa glo-
bal estabelecido pela Organização das
Nações Unidas – ONU e pela Organiza-
ção Mundial da Saúde – OMS, que pre-
tende alcançar três importantes elemen-
tos: proteção da saúde pública, ma-
nutenção da integridade dos ecossiste-
mas e uso sustentado da água.
No Estado do Ceará, a Companhia
de Água e Esgoto do Estado do Ceará, a
partir de 2001, também intensificou as
atividades para o reúso da água, preven-
do investimentos com o objetivo de in-
centivar a pesquisa, o combate ao pre-
conceito contra a água reutilizada e a
implantação de programas de reúso em
escala de demonstração real, bem como
a construção do Centro de Reúso e Trata-
mento de Esgoto e Água da Estação de
Tratamento de Esgoto de Aquiraz, que
vai contar com a parceria das Univer-
sidades Estadual e Federal do Ceará.
A Agência Nacional de Águas, por
sua vez, visando fomentar a reutilização
de águas residuárias, tem participado do
Comitê Gestor do Fundo Setorial de Re-
cursos Hídricos, no âmbito do Minis-
tério da Ciência e Tecnologia, onde, em
2001,
apresentou uma carteira com 79
projetos, dos quais 49 foram aprovados.
Dentre eles estão alguns que tratam so-
bre o tema de reúso de águas.
Outro projeto que conta com o apoio
daANA e que promove o reúso de águas
residuárias é o Programa de Reúso de
Água no Semi-Árido Brasileiro, que está
sendo executado pela Empresa Brasilei-
ra de PesquisaAgropecuária – EMBRA-
PA e pela Universidade Federal da Paraí-
ba e da Prefeitura de Campina Grande.
O objetivo do projeto é implantar um
sistema de referência de uso de efluen-
tes urbanos para a região semi-árida
brasileira, onde serão avaliados a via-
bilidade econômica do tratamento de es-
goto municipal e seu reúso como água
de utilidade na indústria ou como água
de irrigação na agricultura.
Saúde Pública
Uma das questões que ainda não
apresentam um consenso é a que trata
do uso da água de reúso como água
potável. O professor Pedro Caetano
Sanches Mancuso, da Faculdade de
Saúde Pública da USP, lembra que,
embora já exista tecnologia suficiente
para alcançar qualidade de água para to-
das as finalidades, aspectos econômicos
inviabilizam determinados usos. O cus-
to para alcançar uma água “ultra pura”
é tão alto e a tecnologia necessária tão
sofisticada que o seu uso só se justifica
para projetos de tecnologia de ponta,
como os do setor eletroeletrônico, por
exemplo.
Um caso prático que merece
destaque, segundo Pedro Mancuso, é o
projeto do Parque Hopi Hari, situado no
interior do Estado de São Paulo, às mar-
gens de um riacho cuja classe de águas
não comportava qualquer tipo de des-
carga, sendo necessário desenvolver um
trabalho visando atingir a “descarga
zero”, promovendo-se a reciclagem da
água para fins de rega de jardins, usos
sanitários e infiltração no solo. Ele desta-
ca que o nível de tratamento neste caso
é de uma “água quase potável”, com
cuidados extremados para não haver
poluição do lençol freático.
O professor, que acaba de lançar jun-
tamente com outros 13 autores um livro
sobre o assunto, o
Reúso de Água”
(
Editora Mandi
),
chama atenção para
a questão da disposição adequada do
lodo resultante do tratamento dos esgo-
tos. Trata-se ainda de um problema não
equacionado técnica e economicamente.
Favorável ao reúso para fins industriais,
rega de jardins, umidificação de solos,
usos agrícolas, lavagem de ruas, Pedro
Mancuso, lembra, porém, que o assun-
to ainda carece de regulamentação legal
no Brasil.
FIESP cautelosa
Romildo de Oliveira Campelo, dire-
tor titular adjunto do Departamento de
MeioAmbiente e Desenvolvimento Sus-
tentável da FIESP – Federação das In-
dústrias do Estado de São Paulo, diz que
a instituição está lidando com o tema
com “muito cuidado”. Ele concorda que,
tecnologicamente, é possível obter
qualquer tipo de água, porém os cus-
tos, a logística e a falta de disponibili-
dade de água tratada, são aspectos que
justificam a cautela da instituição que
O
úso na prática
Saúde Pública
FIESP c utelosa