fevereiro de 2003
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Romildo da FIESP:
"
Situações bizarras."
representa os em-
presários do Esta-
do de São Paulo.
O diretor de
meio ambiente diz
que a FIESP in-
centiva seus asso-
ciados a promo-
ver o chamado
reúso interno” de
suas águas re-
siduárias. Até
porque diante de
situações no míni-
mo bizarras, as in-
dústrias em São
Paulo devem pa-
gar para colocar
suas águas servi-
das nas tubulações da concessionária do
serviço de saneamento do estado,
efluentes esses que a concessionária irá
jogar nos rios novamente, pois ainda está
longe o dia em que os esgotos chegarão
às grandes estações de tratamento exis-
tentes. Faltam os chamados intercep-
tores.
Romildo lembra que as indústrias
foram obrigadas a promover o tratamen-
to de seus efluentes, por conta do
Pro-
jeto Tietê
que promoveu o controle da
poluição hídrica. Nada mais coerente,
portanto, que haja o reaproveitamento
desta água para fins industriais, ou para
serviços de limpeza, rega de jardins, res-
friamento de equipamentos. Promove-
se de uma só vez economia na captação
de água nos rios e também na conta do
esgoto.
Anicia A. B. Pio, engenheira e es-
pecialista em Recursos Hídricos, do
Departamento de Meio Ambiente da
Fiesp, lembra que hoje ainda não ocorre
a cobrança pelo uso da água captada
nos mananciais, o que, a seu ver, tam-
bém contribui para o não crescimento
do uso da água reciclada. Ela avalia
que, quando a cobrança ocorrer, o mer-
cado do reúso da água será inevitavel-
mente incrementado. A engenheira
lembra que há regiões onde, em época
de estiagem, a escassez do recurso é
uma realidade e que ocorrem situações
onde os mananciais estão exagerada-
mente comprometidos, exigindo
grandes investimentos para seu trata-
mento antes do uso, fatores estes que
podem incrementar o mercado do
reuso de águas.
Os dois representantes da indústria
paulista concordam que é necessário
haver uma regulamentação legal da
matéria. Porém, antes disso, dizem que
é preciso haver uma “descomplicação”
da legislação ambiental e de recursos
hídricos já existente.
água é um recurso natural limita-
do. Assim a define a lei de Políti-
ca Nacional de Recursos Hídricos
O reúso da água e a “sanção premial”
A
em seu art. 1º, inciso II. A PNRS prevê,
dentre seus objetivos, “a utilização racio-
nal e integrada dos recursos hídricos,
com vistas ao desenvolvimento susten-
tável”, relembrando
nesse dispositivo a im-
portância da garantia
do uso múltiplo das
águas, incluindo o
transporte aquaviário
na gestão integrada dos
recursos hídricos e
adotando a busca pela
utilização racional des-
se recurso ambiental
tão importante.
Essencial à sadia
qualidade de vida e ao
desenvolvimento, des-
de sua utilização para
usos prioritários como o consumo hu-
mano e a dessedentação de animais, até
o uso industrial, a água deve ser utiliza-
da da melhor maneira possível. Uma
forma racional, mas ainda pouco empre-
gada no Brasil, de utilização eficiente
do recurso hídrico, é o reúso.
Talvez o pouco emprego do reúso da
água em nosso país deva-se ao relativo
desconhecimento dessa tecnologia, à fal-
ta de estímulo para sua utilização pelas
indústrias e outras entidades que uti-
lizam a água em suas atividade e ao pre-
conceito doutrinário em fazer uso de
água proveniente de efluentes pós-tra-
tados.
Os fatores acima mencionados, as-
sociados à idéia de ter o Brasil água em
abundância, colocaram todos nós em
situação frágil, perante a realidade dos
fatos. A necessidade de racionalização
do uso desse recurso natural foi impos-
ta à população brasileira na recente cri-
se de energia. O fato, no entanto, serviu
para conscientizar-nos a todos que a
água é um recurso finito.
A difusão, portanto, dos benefícios
do reúso da água é necessária, bem como
sua institucionalização.
Uma forma de otimizar a adoção de
tecnologia de reúso de água é a criação
de mecanismos legais de caráter
econômico, de
sanção premial
para en-
tidades públicas ou privadas que tratem
seus efluentes e deixem em condições
de reúso a água utilizada em suas ativi-
dades. Dessa forma, o recurso hídrico
seria redirecionado à própria atividade
da empresa ou destinado à irrigação ou
outras finalidades ambientais. A sanção
premial é uma forma legal de incentivo,
diferente da sanção punitiva, e pode ser
aplicada sob a forma de desconto
tributário ou compensação parafiscal.
O tradicional sistema de posturas de
ordem sanitária, por outra via, reclama
profunda modificação, para permitir a
introdução do reúso de água no sistema
de esgotamento sanitário, mediante
tratamento diferenciado. Isso evitaria
que a água posta, a alto custo, em
condições de potabilidade e destinada à
dessedentação e higienização humana,
fosse, literalmente, para o ralo ou para
o vaso sanitário, em instalações habili-
tadas para economizar esse recurso.
O Decreto nº 8.648/76, por exem-
plo, regulamentador da Lei nº 997/76,
que dispõe sobre a prevenção e controle
da poluição no Estado de São Paulo,
prevê a obrigatoriedade de pré-tratamen-
to de efluentes advindos de qualquer
fonte poluidora e a sua obrigatoriedade
de lançamento em rede pública de es-
goto, quando houver, mas não contem-
pla incentivo algum àqueles que, indo
além do estrito cumprimento da lei, ado-
tam o reúso da água ou mesmo tratam
seus efluentes em melhor condição que
o sistema público disponibilizado.
Nesse contexto, é possível pensar em
estender o princípio do usuário-pagador
para aqueles que usam menor quan-
tidade de água, devendo tal usuário pa-
gar menos, uma vez que contribui para
a redução da demanda sobre os manan-
ciais e minimiza a contaminação.
Outra externalidade da Política de
Recursos Hídricos, ao não contemplar
o reúso no seu texto legal, será a invia-
bilização de todo o sistema de sanea-
mento público, cuja captação e devo-
lução aos cursos d’água, com ou sem
tratamento, nos centros urbanos, trans-
forma-o no principal cliente do sistema,
e, com certeza, o seu principal pagador...
Para tanto é necessário que sejam
adotadas políticas públicas e sistemas de
gestão, bem como formulada uma ade-
quada legislação regulamentadora que
traga segurança jurídica àqueles que
venham investir no reúso da água.
Fernando e Flavio
Foto: Luiz Cláudio Barbosa
Flavio Rufino Gazani
,
é advoga-
do especialista em direito ambien-
tal, associado do Escritório Pinheiro
Pedro Advogados, hoje cursando
pós-graduação na American Uni-
versity, em Washington-DC, EUA.