ambiente legal
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Um n o v o o l h a r - 2
As quatro fases da convivência com
a natureza
O
relacionamento do homem com a nature-
za mudou ao longo da existência da raça humana.
A invenção da agricultura e de ferramentas como
a foice e o arado primitivo, há aproximadamente
12.000
anos, provocou uma mudança na maneira
do homem se relacionar com a natureza. Surgia a
natureza “humanizada”, ocupada e transformada
pelo homem; constituída pela aldeia, seus domínios
e, principalmente, pela atividade agrícola, que ocu-
pava extensas áreas em torno das moradias e ao
longo dos rios, propiciando grandes colheitas. Os
excedentes agrícolas permitiram a armazenagem
para consumo posterior e troca com outras comu-
nidades por mercadorias de que não se dispunham.
O comércio de produtos agrícolas como o trigo,
a cevada, o azeite de oliva e o vinho, associados à
manufatura e comércio de produtos cerâmicos,
pequenos objetos de metalurgia e joalheria, possi-
bilitaram a ocupação de um número cada vez maior
de indivíduos, resultando na evolução da aldeia
para a cidade.
Com o passar do tempo outras atividades foram
agregadas à agricultura e ao comércio, centralizan-
do a economia da região em uma só cidade, au-
mentando seu tamanho e domínio sobre outras al-
deias e cidades. Desta forma, surgiram as condições
econômicas e políticas propícias para que se for-
masse a elite econômica, os sacerdotes e governantes
(
que geralmente eram constituídos pelos mesmos
indivíduos), os exércitos regulares e as religiões
mantidas pelos templos. Comentando esse perío-
do limítrofe entre a pré-história e a história, Don
Cupitt, filósofo inglês contemporâneo, escreve:
“(...)
as antigas mitologias acertam ao dizer que os
deuses foram os primeiros reis, os primeiros senho-
res da terra e a primeira classe alta. É razoável pos-
tular que a crença nos deuses desse tipo essencial
se desenvolveu lentamente no período após 7.500
AC., quando tiveram início as atividades agríco-
Na perspectiva do autor desse instigante artigo, é preciso mudar nossa visão do planeta, de uma
maneira consciente, como conhecedores que somos, no agora, de todas as transformações da História.
Por Ricardo Rose
las e a fixação ao solo. Os deuses corporificavam
e eram as concentrações maciças da autoridade sa-
grada e poder disciplinar, necessária para a evolução
das primeiras sociedades estatais. A única maneira
de transformar um nômade em cidadão era induzir
nele o temor a um deus.” (Depois de Deus, Rocco
Editora, 1999).
A cidade e os campos agrícolas faziam parte da
natureza dominada e conhecida pelo homem; este
era o seu lar. Ele estava familiarizado com seus habi-
tantes, os animais e as plantas, e com suas transfor-
mações; as cheias dos rios e a seqüência das estações.
Para além dos limites desta natureza “humanizada”,
relativamente ordenada e conhecida, encontrava-se
o caos, o mundo selvagem, sujeito à própria sorte
Ricardo Rose é formado em
Jornalismo e tem vários cursos de
especialização em Meio Ambiente
e Energia. Desde 1997 atua como
diretor de Meio Ambiente na Câmara
Brasil-Alemanha. É membro-fundador
do Comitê Inter-Câmaras de Crédito
de Carbono (Carbontrade).
e ainda não ordenado pela
ação do homem. Era um
lugar a ser evitado, domi-
nado por forças e entidades
estranhas e mais fortes do
que o homem. Esta nature-
za selvagem, contraposta à na-
tureza humanizada – quase sua
antípoda –, estava localizada
na floresta, nas montanhas
isoladas e nos desertos, nos
pântanos, nos mares e nas
regiões remotas. Este mun-
do era pouco freqüentado;
só aventureiros ou fugitivos
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