Revista Ambiente Legal
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A
carta de intenções da Rio+20 pode ter sido
considerada inócua por alguns críticos, mas pro-
moveu mobilização e visibilidade mundial. “Há
sementeiras distribuídas nas várias esferas sociais
sobre a importância de consciência mundial para
um desenvolvimento sustentável”, disse o pensador
e filósofo francês Edgar Morin, 91 anos, um des-
ses protagonistas da história que leva suas reflexões
para diversos pontos do globo, para entornar mais
adubo nessas tais “sementeiras de consciência”.
Morin, com mais de 30 livros publicados, entre
eles “O Método” (seis volumes), “Cabeça Bem Fei-
ta” e “O Enigma do Homem”, veio ao Brasil para
participar da Rio+20, e, em seguida, aceitou o con-
vite do SESC para vir a São Paulo, proferir palestra
sobre a necessidade de uma consciência mundial
para o desenvolvimento do século 21. Defendeu
posições radicais como a liberalização das drogas
para retirar o poder dos traficantes e a substitui-
ção da democracia parlamentar e da economia de
mercado que fizeram da história um sinônimo de
guerras.
A importância teórica de Morin está ligada ao
pensamento complexo, que nega a linearidade do
pensamento e a especialização dos saberes, defen-
dendo a feitura de conexões permanentes entre o
contexto e as partes, bem como entre as várias áreas
do conhecimento. A ambivalência do ser humano,
segundo Morin, não está apenas entre “o ser bom
ou ruim”, mas permeia todas as ações humanas e a
cultura contemporânea. Se aparentemente pode-se
saber tudo por meio das redes midiáticas, como a
Wikipedia, por outro, o saber está compartimen-
tado e disperso, é muito difícil conseguir conheci-
mento sistematizado, falta conexão entre os saberes,
temos de construir um conhecimento pertinente”,
como explicou Morin.
Outra ambivalência apresentada pelo filósofo
é a mundialização, que é “o melhor e o pior que
já aconteceu para a humanidade”. Para Morin, en-
quanto se considera que a globalização permitiu
que a pobreza se transformasse em classe média,
ela representa também a destruição da solidarie-
dade, da assistência particular e religiosa e isso
afeta o número assustador de um bilhão de seres
humanos que vivem hoje na miséria, nas favelas
dos centros urbanos, expurgados da sua terra na
zona rural.
De acordo com o filósofo, ao mesmo tempo
em que o desenvolvimento incontrolável destrói
a biosfera, “estamos nos direcionando ao abismo”.
E acrescentou: “Pela primeira vez na história existe
uma comunidade de destino. Podemos esperar e as-
pirar que a terra se torne uma pátria, sem destruir
as outras pátrias, mas englobando-as, compreender
a unidade na sua diversidade, pois somos idênti-
cos e diferentes ao mesmo tempo, nem gêmeos são
idênticos totalmente e a cultura só existe através
das diversidades”.
Sobre a Rio+20, Morin acredita que houve “um
grande retrocesso e um passo à frente, pequeno. Vol-
tamos ao passado, com ausência de agência interna-
cional distinta para tratar das questões ambientais,
como era a proposta francesa”. Mas o fracasso era
previsível, segundo Morin: “Infelizmente falta um
risco concreto, precisamos esperar catástrofes para
progredir”.
O ponto positivo de toda a movimentação in-
ternacional no Rio, para Morin, foi a existência de
uma tomada de consciência de que é preciso ligar
os variados problemas. “É importante compreen-
dermos que problemas da biosfera não são tratáveis
isoladamente, via energia mais limpa ou menos car-
bono na atmosfera”, afirmou.
Unidade na
diversidade”
Filósofo francês Edgar Morin, 91 anos,
analisa a Rio+20 e o desenvolvimento
Por Danielle Denny e Helena Charro