dez. 2001 / janeiro / fevereiro de 2002
5
Lei 6938 - 20 Anos
Antônio Inajê de Assis
Oliveira
,
advogado, foi
assessor do professor Paulo
Nogueira Neto, contribuindo
especialmente na elaboração do
texto legal que regulamentou a Lei
6938.
Atua no CEBDS – Conselho
Empresarial Brasileiro para o
Desenvolvimento Sustentável e é
presidente da ABAA – Associação
Brasileira dos Advogados
Ambientalistas.
Para ele a Lei 6938 é “extraordina-
riamente boa”. E explica: “Enquanto o
Delfim Neto e o Regime Militar centra-
lizavam as coisas no País, a Lei veio com
uma mensagem de descentralização. A
lei é sábia. Entregou para os Estados a
gestão ambiental. Há 20 anos os municí-
pios não davam importância para o meio
ambiente. Mas é no município que ocor-
rem as coisas e é lá também que a po-
pulação exerce uma influência mais dire-
ta sobre o poder.”
Antônio Inajê lembra, porém, que
existem aspectos que necessitam ser
corrigidos. Ele destaca, por exemplo,
que o Decreto 9974/ 1990, que regula-
mentou a Lei da Política Nacional do
Meio Ambiente, está totalmente ultra-
passado. E exemplifica: segundo esse
decreto, quem licencia usinas atômicas
no Brasil é a CNEN – Comissão Nacio-
nal de Energia Nuclear e o Ministério
de Ciência e Tecnologia. Com a Lei dos
CrimesAmbientais isso tudo mudou, ou
seja, o SISNAMA está defasado.
Ao reverenciar a Lei que, na sua
visão, proporcionou mudanças profun-
das na sociedade brasileira,Antônio Ina-
jê diz, porém, que obras como a do Cris-
to Redentor ou do Bondinho do Pão de
Açúcar teriam dificuldades de serem
aprovadas pelos preceitos ambientais
vigentes. E, se assim fosse, o mundo
certamente estaria privado destes dois
belos cartões postais que veiculam in-
ternacionalmente a imagem da “Cidade
Maravilhosa”. Porém, é verdade, tam-
bém, que hoje temos áreas protegidas e
que, não fosse a lei, certamente estariam
destruídas. “Lei cujomérito deve ser dado
à atuação impar do doutor Paulo Noguei-
ra Neto”, diz o advogado e amigo.
O advogado, porém, não deixa de
aproveitar a oportunidade para dizer que
muitas coisas têm sido feitas ao longo
desses anos que, segundo seu ponto de
vista, não são corretas e precisam ser
corrigidas. Ele dá o exemplo da Re-
solução 237/97 do Conama, aquela que
dá poderes aos municípios para o licen-
ciamento ambiental, para dizer que se
trata de “uma besteira inconstitucional”.
Na sua visão, a Constituição de 67 já
dava poderes aos municípios para legis-
lar sobre o uso do solo, sendo assim,
desnecessário que o Conama conferisse
aos municípios poderes para o licencia-
mento ambiental. Ao seu ver “o artigo
30
da Constituição de 88 está sendo uti-
lizado de maneira oblíqua para atender
a interesses municipais de licenciamen-
to ambiental para determinados em-
preendimentos”.
Werner E. Zulauf
engenheiro e consultor ambiental.
Ocupou diversos cargos nas
administrações públicas da União,
Estados (São Paulo e Santa
Catarina) e no Município de São
Paulo, onde destacou-se como o
responsável pela criação da
Secretaria Municipal do Verde e
Meio Ambiente.
Ele não se cansa de mencionar que
a Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente é um “mérito pessoal do pro-
fessor Paulo Nogueira Neto, o decano
da questão ambiental no Brasil”. Ele
destaca o “trabalho messiânico do dou-
tor Paulo”, que, viajando pelo Brasil,
lutava para criar órgãos ambientais em
todos os Estados brasileiros, como eta-
pa importante para o fomento da cultu-
ra ambiental entre nós. É lógico que ain-
da hoje existem Estados em que as ins-
tituições ambientais não funcionam
bem, mas isso é outro problema.
Zulauf, um municipalista convicto,
diz que a Lei 6938 já trazia em seu bojo
a mensagem da descentralização com-
pleta da gestão ambiental, pois postula-
va que o Sistema Nacional do Meio
Ambiente deveria ser composto por um
órgão central no âmbito Federal, órgãos
seccionais dos Estados e locais (nos
Municípios). Infelizmente, a ação,
naquela época, estacionou nos Estados,
o que já não foi pouco. Mais tarde sur-
giria a Anamma – Associação Nacional
de Municípios e Meio Ambiente, uma
ONG voltada para o fomento da cultura
ambiental nos municípios, que deu alen-
to à criação de sistemas municipais de
meio ambiente.
Werner Zulauf não tem dúvidas tam-
bém de que a Lei 6938 teve influência
decisiva na elaboraçãodo notável Capítulo
do Meio Ambiente da Constituição de
1988.
Ele lembra outro episódio impor-
tante. Pouco antes da edição da Constitui-
ção, o então presidente da República, José
Sarney, editou um“pacote verde” que fun-
dia diversos órgãos setoriais e criava o
IBAMA. Assim, o Sisnama tinha a sua
cabeça no governo federal, os braços eram
as agências estaduais e os municípios se-
riam o complemento dessa estrutura des-
centralizada. Porém, era natural e inevitá-
vel que houvesse conflitos entre os órgãos
criados e os anteriores, bem como entre
as diversas esferas de governo. “Não é fácil
mudar amentalidade e fazer instituições e
corpos técnicos inteiros ceder pedaços do
poder que detinham”, diz, lembrando os
desafios que teve que enfrentar já na déca-
da de 90, quando esteve à frente da Se-
cretaria do Verde e Meio Ambiente do
Município de São Paulo. “Abrir a caixa
preta do controle ambiental de instituições
tradicionais como a CETESB não é uma
tarefa simples”, diz.
A criação do Conselho Nacional do
Meio Ambiente – CONAMA também é
considerado outro aspecto relevante da
Lei 6938. Trata-se de umConselho mul-
tisetorial, intergovernamental e multire-
presentativo, com condições de agir de
forma consultiva e principalmente delibe-
rativa. Zulauf acha importantíssimo que
as Resoluções do Conama tenham força
de Lei. “É uma forma inovadora, ágil de
se legislar, uma vez que as resoluções en-
tram em vigor muito mais rapidamente
que os projetos de lei que tramitam pelo
Poder Legislativo. Quando há algo para
ser corrigido o processo também é
bastante dinâmico e rápido.
Satisfeito com o que chama de pro-
cesso de aperfeiçoamento do Conama,
Zulauf informa que, embreve, os municí-
pios brasileiros estarão melhor represen-
tados no Conselho. Atualmente, apenas
um representante fala em nome de mais
de 5.500 municípios. É o representante
da Anamma. Serão oito representantes,
melhorando a performance das menores
unidades da federação, que possuem
grandes diversidades regionais, vocacio-
nais, extensões territoriais, populações e
aspectos sociais, econômicos e ambien-
tais que precisam ser melhor representa-
dos neste fórum privilegiado.