ambiente legal
Por Antonio Fernando
Pinheiro Pedro*
D
esmandos e desleixos tu-
piniquins no trato do controle
territorial e econômico dos nossos
recursos ambientais, bem como a
dificuldade de impor autoridade
na resolução dos conflitos sociais e
no combate à criminalidade com
efeitos internacionais, podem vir a
justificar medidas intervencionistas
na Amazônia brasileira.
Se isso acontecer, não se surpre-
enda nossa “inteligentsia” de plan-
tão, pois o sistema internacional
poderá não tratar o caso como in-
gerência indevida ou afronta à nossa
soberania nacional.
De fato, o intervencionismo
politicamente correto” tende a ser
legitimado pelos novos marcos re-
gulatórios internacionais, e é risco
estratégico a ser considerado no
desenvolvimento das relações diplo-
máticas com blocos econômicos e
regionais de nosso globo.
No âmbito das relações inter-
nacionais, impera hoje o que vou
denominar Soberania Afirmativa,
ou seja, os tratados e convenções
internacionais não adotam mais
um conceito formal de autodeter-
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minação ou meramente nominal
de soberania nacional para traçar
linhas de implementação dos seus
objetivos. Agora, os diplomas inter-
nacionais vêm utilizando o conceito
difuso de “direitos de soberania” ,
vinculando o exercício da soberania
a provas materiais de efetivo con-
trole do Estado sobre seu território.
Um exemplo prático e emble-
mático da implementação do con-
ceito de soberania afirmativa nos
diplomas internacionais é a Con-
venção Sobre os Direitos do Mar.
Trata-se de texto legal ambiental
internacional da mais alta impor-
tância, que, quando entrou em
vigor em 1993, fez reduzir o mar
territorial brasileiro de 200 milhas
marítimas para 12 milhas. Sobre a
faixa anterior o Tratado resguardou
uma Zona Econômica Exclusiva,
condicionando “direitos de sobera-
nia” ao Estado Brasileiro, desde que
este inventarie e controle os recursos
econômicos nela existentes.
Em função do Tratado, o gover-
no brasileiro instituiu aCIRM–Co-
missão Interministerial de Recursos
do Mar e obrigou-se, entre outras
providências, a realizar inventários
periódicos na plataforma marítima,
visando manter os direitos de sobe-
rania sobre a ZEE, permitindo-se
até mesmo ampliá-la para blindar o
país de novas supressões.
O exemplo acima torna incon-
testável a relativização do tradicio-
nal conceito de soberania nacional
e nos alerta para conseqüências
estratégicas dessa nova tendência.
Importante considerar, para tanto,
que o conceito de “Justiça Ambien-
tal”, no âmbito internacional, inclui
aspectos e conflitos de natureza
ideológica, étnica, social, religiosa
e fundiária, ao contrário da visão
reduzida e estreita que, no Brasil,
observamos inscrita no termo.
Uma análise do cenário mun-
dial nos informa que o conceito
difuso da soberania afirmativa tem
legitimado, ao longo dos últimos
15
anos, notadamente após a queda
do muro de Berlim e o advento da
chamada “globalização” econômi-
ca, a intervenção de forças armadas
estrangeiras em estados nacionais
sem prévia declaração oficial de
guerra, com objetivo cirúrgico de
solucionar toda ordem de conflitos
ambientais e sociais, internos ou re-
gionalizados. Intervenções militares
autorizadas pelo Conselho de Segu-
rança da ONU no leste europeu, na
Ásia, África e até na América Lati-
na – Haiti é um exemplo recente
ocorrem em função da Soberania
Afirmativa.
Os Estados Unidos da América,
sempre seguidos da Grã Bretanha,
postaram-se à vanguarda do con-
ceito e relativizaram, como efeito
da hoje chamada unipolaridade
mundial, até mesmo a postura “he-
sitante” da ONU em autorizar ou-
tras tantas intervenções julgadas de
interesse difuso internacional.
Nesse novo quebra-cabeça
geopolítico, surgiu, em 1997, uma
nova peça importante. Nesse ano, as
Forças Armadas norte-americanas
impuseram mudança estratégica em
sua política de defesa continental:
deixaram de lado a doutrina pontu-
al (do tipo “dominó” – país a país),
denominada “Segurança Nacional”,
para assumir uma “Doutrina de
Segurança Ambiental”, de regiona-
lização dos meios de defesa e inter-
venção nos conflitos no Continen-
te Americano, visando a proteção
conjunta dos recursos ambientais
essenciais, dos biomas de interesse
global e controle de conflitos que
pusessem em risco a segurança das
Soberania afirmativa
sobre nosso ambiente
F r a n c ame n t e
Foto: Luiz Claudio Barbosa