ambiente legal
Em agosto de 2003, o IBAMA suspendeu as
autorizações de desmatamento e a aprovação de
manejo para detentores de posse que não possuíam
título, ou seja, encontravam-se ocupando terras pú-
blicas. Na esteira desse processo, o INCRA, a partir
de 2004, suspendeu a emissão de protocolos de in-
tenção de posse e promoveu o recadastramento de
todos os detentores de documentos anteriormente
emitidos nas regiões mais críticas da Amazônia.
Ao assumir que a Amazônia é composta de
75%
de terras públicas e que 20 milhões de pes-
soas vivem na região, a pergunta que cabe é: como
compatibilizar a sobrevivência e o desenvolvimento
socioeconômico com a manutenção da floresta? A
resposta a essa pergunta passa necessariamente pela
decisão de como gerir as florestas públicas.
No caso, existem três alternativas para o gestor
dos bens e serviços públicos: privatizar, fazer a gestão
direta ou permitir a gestão indireta (concessões).
A privatização significaria entregar a posse e o
domínio da terra para um ente privado. O proble-
ma central nessa opção é que a História mostra que
a opção mais vantajosa, do ponto de vista finan-
ceiro e de curto prazo, é explorar todo o recurso e
desmatar, mas essa opção contraria o interesse de
longo prazo da sociedade em garantir os benefícios
da floresta (produtos, proteção de mananciais etc.).
Não é à toa que os países com maior cobertura flo-
restal no mundo têm grandes extensões de florestas
públicas.
Uma segunda alternativa seria criar uma “flores-
tabras” e realizar a gestão direta. Contudo, a Cons-
tituição Federal do Brasil considera o Estado como
ente regulador da economia, portanto, com exceção
de áreas especificas definidas na própria Lei Maior
(
ex. energia nuclear, telefonia e saneamento básico),
o Poder Público não pode atuar como interventor
na economia. A gestão direta só é permitida no caso
das Unidades de Conservação de uso sustentável,
onde os órgãos ambientais são responsáveis pela
gestão com o objetivo principal de conservação. É o
caso das Florestas Nacionais.
Por fim, existe a possibilidade de conceder, por
meio de outorga ao particular, o direito de prati-
car o manejo florestal sustentável, mas desde que
mantenha o patrimônio público. Para esse modelo,
entretanto, não há previsão legal que permita con-
tratos de prazo compatível com a atividade florestal
e com critérios de seleção dos concessionários que
incluam aspectos sociais e ambientais.
Foi neste contexto que se elaborou o PL de
Gestão de Florestas Públicas. Foram 15 meses para
preparação da lei, en-
volvendo um amplo
processo de consulta
pública que ouviu
mais de 1200 insti-
tuições e outros 12
meses de tramitação
no Congresso Nacio-
nal até sua aprovação,
em fevereiro deste
ano. A Lei 4776/05
estabelece o marco
regulatório para a
gestão de florestas
públicas, incluindo
os instrumentos para
sua implementação.
Em síntese, existem três opções de gestão para
florestas públicas: criar e manter UCs de uso sus-
tentável, destinar essas áreas para o uso familiar ou
comunitário e, após esgotadas as opções anteriores
para uma determinada região, realizar contratos de
concessão de até 40 anos baseados em processo de
licitação pública.
As concessões não implicam em transferência de
domínio ou posse das áreas aos particulares, apenas
autorizam o bom manejo para exploração de produ-
tos e serviços da floresta. As florestas públicas per-
manecerão, portanto, sob o domínio do Estado.
Nos mais de 80 artigos da nova lei há uma série
de precauções para garantir transparência e controle
social, evitar concentração de poder econômico, as-
segurar acesso aos pequenos produtores e manter a
efetiva fiscalização do sistema a ser implantado.
A fiscalização que hoje é função exclusive do
IBAMA passará a ser exercida em vários níveis:
IBAMA e órgãos estaduais de meio ambiente fis-
calizarão o cumprimento das normas ambientais; o
Serviço Florestal Brasileiro (SFB) e os órgãos de ges-
tão estadual fiscalização o cumprimento dos con-
tratos de concessão e serão obrigatórias auditorias
independentes, no mínimo, a cada três anos.
Nos dez primeiro anos de aplicação da lei - fase
experimental prevista nas disposições finais -, aplica-
dos todos os “filtros” previstos, estima-se que haverá
13
milhões de hectares de concessões florestais (3%
da Amazônia) e 25 milhões de hectares de florestas
destinadas ao uso comunitário e familiar.
O desafio colocado para o Estado e a socieda-
de brasileira é a implementação e fiscalização desse
novo modelo que representa uma mudança radical
na forma de encararmos as florestas públicas.
As concessões
não implicam em
transferência de
domínio ou posse das
áreas aos particulares,
apenas autorizam
o bom manejo
para exploração de
produtos e serviços da
floresta.
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