Quando até o WWF e Bill Gates confirmam o alerta conservador sobre a geopolítica como vetor econômico na Conferência do Clima
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro*
A Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas (COP30), sediada em Belém do Pará, seria um marco para o Brasil no cenário ambiental internacional se, por trás das promessas de protagonismo verde, não houvesse uma complexa teia de interesses geopolíticos que demandam profunda análise — especialmente por aqueles que defendem uma agenda ambiental baseada na soberania, na prudência e na realidade dos países em desenvolvimento.
Em fevereiro de 2025, publiquei no blog The Eagle View o artigo “Um olhar conservador sobre a COP30 e o Brasil”¹, no qual alertei para o equívoco estratégico de se priorizar ações de mitigação em detrimento da adaptação e da resiliência. Isso porque essa escolha não é neutra: ela expressa uma vontade globalista-progressista de impor limites ao desenvolvimento dos países do “Sul Global” (um jargão típico da tendência globalista), transferindo para estes um passivo ambiental do “Norte Global” e transformando suas economias em laboratórios de alternativas energéticas custosas e arriscadas. Algo como substituir o esforço colaborativo de adaptação e resiliência por… indulgências climáticas.
Eis que às vésperas da COP 30, leio em uma entrevista concedida por Tatiana Oliveira, líder de estratégia internacional do WWF-Brasil ao Correio Braziliense², uma confirmação — ainda que por outra via — dos mesmos alertas que há muito venho fazendo.
Ou seja, a improvável convergência adveio da constatação que, no debate climático, não há mais espaço para a ingenuidade.
Mitigação como prioridade: um erro geopolítico
Tatiana foi clara ao afirmar que 60% do financiamento climático mundial é destinado à mitigação, enquanto apenas 30% vai para adaptação e perdas e danos. Isso significa que os países mais vulneráveis às mudanças climáticas — justamente os que menos contribuíram historicamente para o problema — recebem menos recursos para se proteger e mais pressões para reduzir emissões.
Essa lógica revela um desequilíbrio estrutural: enquanto os países desenvolvidos mantêm suas matrizes energéticas e seus padrões de consumo, os países em desenvolvimento são constrangidos a preservar florestas, limitar o uso da terra e adotar tecnologias verdes ainda incertas.
Financiamento climático: indulgências e dívida
Outro ponto de convergência entre minha análise e a entrevista do WWF está na crítica ao modelo de financiamento. Tatiana denuncia que a maior parte dos recursos chega em forma de empréstimos, com juros altos e risco cambial, o que acaba endividando ainda mais os países do Sul Global. Em suas palavras: “Muitos acabam pagando mais em juros do que receberam inicialmente.”
Essa constatação reforça o argumento de que o financiamento climático, tal como estruturado hoje, não é um mecanismo de solidariedade internacional, mas sim uma ferramenta de controle geopolítico e financeiro.
Em verdade, há uma transferência de indulgências climáticas… para os ombros de quem deveria receber apoio financeiro e, no fim, acaba endividado e limitado pelas penas que lhe foram transferidas.
O Brasil como laboratório energético
A entrevista também aborda o papel do Brasil como campo de testes para soluções ambientais e energéticas. O Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), por exemplo, embora tenha méritos, ainda carrega o risco de subordinar a gestão dos recursos naturais brasileiros a interesses externos, especialmente quando envolve instrumentos de mercado como debêntures e títulos verdes.
Além disso, a pressão internacional contra a exploração de petróleo na Foz do Amazonas é outro exemplo de como o Brasil é cobrado por decisões que países desenvolvidos não aplicam a si mesmos.
Essa armadilha já foi experimentada na América do Sul com o REDD+ e foi objeto de um outro artigo meu, sobre o que ocorreu no Equador³.
O fator Bill Gates
Em uma impressionante reviravolta no mundo ativista, Bill Gates, um dos principais defensores da redução das emissões de carbono, publicou notável dissertação às vésperas da COP 30, na qual argumenta que os recursos devem ser desviados da batalha contra as mudanças climáticas, para apoiar o combate à fome e à miséria (ou seja: resiliência humana).
Argumenta Gates que em vez de apoiar medidas de mitigação e crédito de carbono, “os filantropos do mundo devem aumentar seu investimento em outros esforços voltados para a prevenção de doenças e fome”.
Confesso que o argumento soou como um verdadeiro CQD (como queríamos demonstrar). Ou seja, o bilionário filantropo Bill Gates parece aderir agora, por outras vias, à minha histórica tese conservadora.
Segundo noticiou a CNN 4 às vésperas da COP 30, Gates declarou que ” a crise climática não vai acabar com humanidade”, aduzindo ainda que “os investimentos passados em combate às mudanças climáticas foram mal colocados, e muito dinheiro bom foi investido em esforços caros e questionáveis”.
“Esta é uma oportunidade para voltar a focar na métrica que deve contar ainda mais do que as emissões e mudanças de temperatura: melhorar vidas. Nosso principal objetivo deve ser evitar o sofrimento, especialmente daqueles que vivem em condições mais difíceis nos países mais pobres do mundo”, completou o fundador da Microsoft.
Isso revela que não só a militância globalista reconhece o que vínhamos ponderando há anos… como quem a financia também acorda para a questão, o que é sintomático.
Convergência inesperada: o alerta é comum
É revelador que uma liderança do WWF — organização historicamente alinhada a pautas progressistas — e um de seus principais apoiadores, Bill Gates, reconheçam os mesmos problemas que venho denunciando sob uma ótica conservadora. Isso mostra que, independentemente do viés ideológico, há uma preocupação legítima com a justiça climática, a soberania nacional e a eficácia das políticas ambientais.
Essa convergência deve ser vista como uma oportunidade: o debate ambiental precisa ser plural, técnico e livre de dogmas. O Brasil tem muito a contribuir, mas não pode fazê-lo abrindo mão de sua autonomia e de sua realidade socioeconômica.
Conclusão: por uma agenda ambiental soberana
A COP30 será um palco importante — e perigoso. Cabe ao Brasil reafirmar sua liderança ambiental com base em sua própria visão de desenvolvimento, valorizando o conhecimento local, a propriedade privada, a produção rural e a tecnologia nacional.
A entrevista do WWF, e Bill Gates, confirmam: o alerta conservador não é exagero — é diagnóstico.
Notas:
1-PEDRO, Antonio Fernando Pinheiro – “Um Olhar Conservador Sobre a Cop 30 e o Brasil”, in https://www.theeagleview.com.br/2025/02/um-olhar-conservador-sobre-cop-30-e-o.html
2-CORREIO BRAZILIENSE – “Líder do WWF: Financiamento Climático é Desigual”, in https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2025/10/7279321-lider-do-wwf-brasil-o-financiamento-climatico-e-desigual.html
3- PEDRO, Antono Fernando Pinheiro – “Crise no Mercado de Carbono”, in https://www.theeagleview.com.br/2013/09/a-crise-no-mercado-de-carbono.html
4- CNN BRASIL, “Crise Climática Não Vai Acabar com a Humanidade – diz Bill Gates em Nova Tese”, in https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/crise-climatica-nao-vai-acabar-com-humanidade-diz-bill-gates-em-nova-tese/
*Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados e Diretor da AICA – Agência de Inteligência Corporativa e Ambiental. É membro do Conselho Superior de Estudos Nacionais e Política da FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Membro do Centro de Estudos Estratégicos da Iniciativa DEX, Presidente da UNIÁGUA – Associação Universidade da Água e Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa – API. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.
Fonte: The Eagle View
Publicação Ambiente Legal, 04/11/2025
Edição: Ana Alves Alencar
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