Por Karina Mekhitarian*
Após várias mudanças em relação ao texto original da Presidência da República, no dia 24/04/13, a Comissão Mista formada pelo Senado Federal aprovou a Medida Provisória 595 (“MP dos Portos”), que estabelece novas regras sobre a exploração de portos, instalações portuárias e das atividades desenvolvidas pelos operadores portuários em nosso país.
Ato contínuo, o texto aprovado pelo Senado foi submetido à análise da Câmara dos Deputados, que aprovou o texto final na manhã do dia 16/05/13, último dia de vigência da MP antes de perder sua validade. No mesmo dia, em sessão histórica e relâmpago nunca vista no Senado Federal, depois de muita articulação e acordos políticos, a MP foi aprovada no Senado e seguiu para sanção presidencial.
Na prática, esta norma busca resolver os conflitos legais e institucionais do setor portuário brasileiro, especialmente para os investidores da iniciativa privada.
A MP dos Portos promete solucionar o gargalo logístico que o País vem enfrentando há décadas na medida em que permite a instalação de Terminais Portuários Privados, além da nova modalidade de Estação de Transbordo de Cargas, sem a necessidade de comprovação de cargas próprias, principal fator de restrição legal até então existente.
Até pouco tempo, existia um emaranhado de normas infraconstitucionais (Lei Federal nº 8.630/1993 – antiga “Lei dos Portos”) e infralegais (Decreto Federal nº 6.620/08, Resoluções ANTAQ nº 517/05, nº 1.555/09, nº 1.660/10 e 2.520/12) conflituosas, tratando da mesma matéria, sendo algumas delas claramente ilegais, pois acabaram inovando direitos e obrigações aos cidadãos/empresários do setor por meio de Portarias e Decretos, instrumentos legais inadequados para esta finalidade.
De acordo com primeiro marco legal do setor portuário (Lei Federal 8.630/93), para implantação de terminais portuários de usos privativos mistos (os conhecidos “TUPs”) existia a necessidade de comprovação de cargas próprias (movimentação de carga da própria empresa) e de terceiros (movimentação de carga de outras empresas), porém, sem um limite estabelecido para cada uma delas.
Por consequência, os TUPs, operados pelo setor privado e contando com quadro profissional mais eficiente e estrutura física e de equipamentos modernos, passaram a competir diretamente e, de certa forma interferir, na própria função de operação portuária do Poder Público.
Esse quadro levou o Governo, mediante edição da Resolução ANTAQ nº 517/05 e do Decreto Federal nº 6.620/08, a determinar que os terminais mistos comprovassem a movimentação preponderante de cargas próprias que justificasse sua implantação, sendo a carga de terceiros em caráter subsidiário e eventual.
Com essa medida, considerando que a maioria dos TUPs mistos movimentava apenas cargas de terceiros e não teria como comprovar a carga própria, houve restrição à criação de novos terminais privados.
Pelo ordenamento jurídico brasileiro não resta dúvida de que o referencial para criação de direitos e deveres para pessoa física e jurídica será sempre a lei, produzida em consonância com fundamentos constitucionais.
Ocorre que a realidade brasileira é outra. Em razão da omissão do Poder Legislativo na criação de normas específicas para área ambiental, órgãos do Poder Executivo vinculados ao setor portuário (ANTAQ, SPU, CONAMA), por exemplo, tentando aparar as arestas, acabam instituindo normas para todo lado.
Felizmente, com a nova norma federal, as regras para investimentos privados no setor portuário se tornaram mais claras, transparentes e legítimas, passo importante para proporcionar segurança jurídica aos empresários, operadores do direito e à própria Administração Pública envolvida.
Uma das mudanças propostas pelo Senado e que foi considerada um dos principais pontos de entrave para sua aprovação no Congresso refere-se ao prazo de renovação dos contratos de concessão de terminais portuários firmados antes de 1993, entre empresas privadas e União. Isto porque a proposta original previa o tempo máximo de cinco anos para renovação desses contratos, prazo extremamente curto para aqueles que investiram fortemente no setor e com incentivo do próprio Poder Público.
Em razão do vácuo legislativo que existia no setor portuário antes da vigência da “Lei de Portos” em 1993, o Congresso Nacional buscou estabelecer acordo razoável com o Governo em relação ao prazo de renovação dos contratos firmados antes de 1993 (10 anos), evitando, assim, insegurança jurídica e prejuízos imensuráveis às empresas envolvidas.
Apesar de toda negociação do Poder Legislativo perante o Governo sobre o assunto, esse foi um dos pontos vetados pela Presidência, sob a justificativa de garantir a livre concorrência no novo marco regulatório.
Ainda que tardia e mesmo sem um consenso, a iniciativa do Governo Federal para disciplinar esta atividade é louvável, uma vez que poderá resolver, de forma legal e amplamente discutida pela sociedade, os gargalos que os portos brasileiros vivenciam há décadas.
Em desfecho ao trâmite legislativo, no dia 05/06/13, a Presidenta sancionou o texto aprovado pelo Congresso Nacional, com treze vetos, tornando realidade a novela da MP dos Portos, hoje Lei Federal nº 12.815/2013.
*Karina Mekhitarian é advogada formada pelo Centro de Estudos Superiores de Maceió. Especialista em Direito Processual pelo Centro Universitário de Ciências Jurídicas de Maceió e com mestrado em Direitos Difusos e Coletivos, com foco em Direito Ambiental, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). É professora de Direito Ambiental, no curso de graduação da Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo (FADISP), e de Direito e Gestão do Meio Ambiente, no curso de pós-graduação lato sensu do (SENAC-SP). Coordena a área de Meio Ambiente do escritório Pinheiro Pedro Advogados.