Por Gerson Neto*
Segundo Everaldo Pastore, um grande urbanista de Goiás, o Plano Diretor é um acordo entre vários atores da cidade para buscar equilíbrio entre os vários interesses que coexistem na cidade. Muitos desses interesses são claramente conflitantes: casais sonhadores e sonhadoras começando a formar família, escolhendo seu primeiro imóvel para construir seu ninho diante de grandes incorporadoras ávidas por vender seus monstruosos prédios cheios de apartamentos minúsculos, grandes lojas varejistas, shopping centers e supermercados disputando compradores com feirantes, ambulantes e o comércio tradicional dos centros das cidades, pobres ocupantes de áreas centrais da cidade sendo empurrados para a periferia, ou para ocupações irregulares, ou pela beira do abismo se ele existir para dar espaço a grandes e lucrativos empreendimentos. Ao poder público e aos técnicos de planejamento urbano cabem o papel de arbitrar esses vários interesses para fazer prevalecer o interesse público sobre o individual e a proteção aos mais fracos diante dos fortes. Mas como eles têm se comportado para exercer esse papel com justiça?
A partir do século 20, impulsionadas pelo processo de modernização da vida dos brasileiros e pela industrialização, as cidades receberam um fluxo migratório que foi se tornando cada vez mais intenso e que ainda não terminou. Com o crescimento da população urbana, muitas cidades passaram por um processo de reurbanização – a exemplo de Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador – e outras novas foram construídas, como foi o caso de Goiânia, Brasília e Belo Horizonte. Foi assim que o planejamento urbano se estabeleceu como uma necessidade da vida moderna nas cidades, para organizar o assentamento de uma população crescente no território de forma racional.
O crescimento das cidades e a valorização de seus terrenos urbanos estabelecem consigo os conflitos por território. Primeiramente, o conflito entre meio ambiente e as obras da cidade. Logo em seguida, os conflitos entre ricos e pobres, automóveis, transporte coletivo, ciclistas e pedestres, agitação comercial e calmaria residencial, grandes empreendimentos e seus vizinhos impactados por eles.
O Plano Diretor é a ferramenta que normatiza a organização do espaço nas cidades, estabelecendo diretrizes de um grande acordo social entre os vários atores políticos da cidade: moradores, mercado imobiliário, empresários, movimentos de luta por habitação, entidades sociais, motoristas, ciclistas, pedestres e outros, que sob a orientação de técnicos, urbanistas e planejadores urbanos, buscam “ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus habitantes”, de acordo com o Artigo 182 da Constituição Federal.
O Plano Diretor deve ser revisto a cada dez anos, conforme determina o Estatuto da Cidade, a Lei Federal 10.257/2001, que regulamenta o planejamento urbano. Estamos agora em plena temporada de revisões de Planos Diretores em muitas cidades brasileiras, contando com os atrasos de alguns anos que é sempre o costume brasileiro de deixar pra última hora. A cidade de Goiânia já está mais de quatro anos atrasada na revisão de seu plano diretor, o último foi publicado em maio de 2007. A partir de 2017, a Prefeitura iniciou o processo de construção do diagnóstico, com estudos sobre a cidade para construir sua proposta de projeto de lei.
Durante esse processo de construção da proposta a Prefeitura de Goiânia não conseguiu executar bem uma das principais exigências legais estabelecidas pelo Estatuto das Cidades. Foram realizadas algumas audiências públicas, mas elas foram insuficientes para uma cidade grande como Goiânia. Dentro das audiências realizadas, as opiniões expressas pelos cidadãos não foram acolhidas no texto de lei, mostrando que, em quase todos esses casos, essas audiências públicas foram realizadas apenas para atender a exigência legal, burocraticamente.
Para a construção de um processo realmente participativo, é necessário um esforço longo de explicar pedagogicamente, primeiro para grupos reduzidos e depois ampliado em plenárias, as bases do planejamento urbano e como ele interfere em seus bairros. Explicar com honestidade as propostas que estão sendo discutidas para que as pessoas possam opinar com propriedade, liberdade e independência.
Goiânia
Neste artigo vamos analisar o Plano Diretor de Goiânia, mas é importante lembrar que as bases principais de ocupação do solo servem para todas as cidades brasileiras e os conflitos são praticamente os mesmos em todas elas. Os temas centrais de que tratam os Planos Diretores são Meio Ambiente, Densidade Urbana, Zoneamento Urbano e Perímetro Urbano. Apesar de eles não estarem assim separados pela lei federal 10.257/2001, o Estatuto das Cidades, todos esses temas são tratados pela lei na apresentação de seus dispositivos regulados. A delimitação desses temas como centro da ocupação do solo é definida por Everaldo Pastore, professor de Planejamento Urbano da PUC-Goiás.
Meio Ambiente
A primeira leitura que deve ser feita na cidade é sobre o meio ambiente. A cidade se assenta sobre um meio físico que a antecede e deve respeitar suas características para manter os fluxos hidrológicos, geológicos e ecológicos característicos desse território. O desrespeito a esse ambiente original impõe à cidade uma série de problemas ambientais, como alagamentos, infestação por doenças, deslizamentos de terra, erosões, extinção de nascentes e cursos d’água, entre outros.
É por isso que perto de rios e nascentes é preciso ter áreas de proteção, parques e unidades de conservação. Quando esses territórios são ocupados por moradias, devem ser chácaras ou lotes grandes, o que quer dizer ter baixa densidade populacional e ocupadas por poucas áreas impermeabilizadas com concreto ou asfalto. Também deve-se respeitar o fluxo das águas subterrâneas, proibindo a construção de prédios perto de nascentes, pelo risco de obstruí-las, como temos visto acontecer em alguns parques de algumas cidades.
Perímetro urbano
A segunda característica principal do planejamento urbano é o perímetro urbano, que é constituído por uma linha imaginária que delimita a área urbana em reação às áreas rurais. No caso de Goiânia, o Projeto de Lei 23/2019 que está em tramitação na Câmara Municipal da cidade mantém o mesmo perímetro do Plano Diretor anterior de 2007, apenas corrigindo alguns pequenos erros cometidos nos limites anteriores que, por exemplo, deixaram fragmentos de alguns bairros fora do perímetro urbano. Isso refletiu no aumento de cerca de 6% no perímetro.
Porém, na Câmara, um grupo de vereadores fez uma emenda reduzindo de forma radical as áreas rurais previstas no PL 23, aumentando a área urbana da cidade em 27,37%. Essa proposta é absurda, uma vez que perto de um terço da cidade já se constitui de vazios urbanos que estão sendo especulados e ficam vazios esperando que seus preços subam. Com essa proposta de emenda, os vazios urbanos dentro do perímetro somariam mais de 50% do território da cidade. A expansão urbana é um instrumento de planejamento do qual se lança mão quando há expectativa de crescimento populacional que justifique a abertura de novos loteamentos.
Além de Goiânia já ter muitos terrenos vazios, a expectativa de crescimento é baixa, segundo dados do IBGE. Esses dados são prejudicados pela não realização do Censo em 2020, mas as projeções estatísticas indicam que a taxa de crescimento populacional de Goiânia diminuirá ano a ano. Em 2010, no último Censo, a taxa era de 2,25% ao ano e a estimativa é de que cairá a 0,88% em 2040. A expectativa de população para a Goiânia de 2040 é de 1.829.665 habitantes, segundo o estudo de demanda feito pela Rede Metropolitana de Transporte Coletivo de Goiânia (RMTC) em 2013.
A análise é antiga, mas não está defasada, já que não fizemos a contagem censitária em 2020. Considerando que a população estimada para 2020 em Goiânia pelo IBGE é de 1.536.097 habitantes, esse crescimento de 293.568 habitantes não seria suficiente sequer para ocupar os vazios urbanos já existentes, muito menos para justificar áreas de expansão urbana. Isso quer dizer que já temos áreas urbanas em Goiânia que nunca serão ocupadas.
O diagnóstico que podemos fazer é de que a cidade de Goiânia já tem lotes vazios demais e que é preciso ocupá-los, pois eles encarecem os custos de infraestrutura da cidade, inviabilizando sua manutenção e condenando seu futuro.
O controle do perímetro é importante para qualquer cidade, e a crítica feita a Goiânia vale para todas as outras. Abrir loteamentos para ocupação populacional acima do apontado pelas estatísticas do IBGE para as curvas de previsão de crescimento populacional é irresponsabilidade e, para mim, crime de improbidade administrativa. Depois de aberto o loteamento é praticamente impossível a reversão dessa medida e a cidade vai ter que conviver eternamente com esses vazios urbanos. O Professor Everaldo Pastore aponta também que a determinação do Estatuto das Cidades de revisar os Planos Diretores a cada 10 anos limita a expansão da cidade para o crescimento populacional ao esperado para esse período. Isso quer dizer que a cidade não pode justificar a abertura loteamentos pensando na ocupação um horizonte de 20 anos.
Zoneamento
A terceira característica que o Plano Diretor define é o zoneamento urbano. O zoneamento é um desenho que os planejadores fazem sobre o mapa da cidade, indicando quais regiões serão estratégicas para as várias atividades econômicas – quais serão as ruas de comércio, onde poderão ser colocadas indústrias de algo grau de incomodidade, quais os locais para as construções destinadas a grandes eventos, onde será permitido maior adensamento, com a construção de edifícios altos, quais as regiões que precisam ser protegidas por causa da sua natureza ambiental etc.
Esse planejamento é feito com base na infraestrutura da cidade, capacidade das redes de esgotos, abastecimento de água potável, energia elétrica e outros e também com base no Plano de Mobilidade Urbana.
O princípio geral de ocupação da cidade de Goiânia, segundo o PL 23, é a “otimização do uso e ocupação do solo ao longo dos Eixos de Desenvolvimento estruturados no transporte público coletivo” (Art. 21, II). O objetivo é que grande parte da população futura tenha sua residência próxima às linhas de transporte coletivo mais intensivas, a partir da estrutura do transporte coletivo da cidade.
Esse princípio segue o modelo de Curitiba, implantado e defendido pelo urbanista e ex-prefeito daquela cidade Jaime Lerner, falecido recentemente. São Paulo também segue esse princípio, incentivando o adensamento nas quadras próximas a estações do metrô. A diferença para Goiânia é que a cidade enfrenta décadas de dificuldades para melhorar a qualidade do transporte coletivo, que perde passageiros a cada ano, fragilizando o princípio da proposta. Muitos urbanistas goianos já buscam superar esse paradigma, propondo uma ocupação a partir das centralidades, analisando cada bairro com suas especificidades em vez de aplicar regras gerais para a cidade.
No caso de Goiânia, os Eixos de Desenvolvimento são assentados sobre corredores que saem das ruas principais e parecem ganhar vida serpenteando pela cidade. O problema é que nessa andança trôpega bairros e regiões onde não existe um transporte coletivo robusto são transformados em áreas adensáveis e muitas ruas estreitas viram eixos de desenvolvimento, contrariando a premissa de planejamento proposta no Plano.
Isso leva a crer que o planejamento econômico da cidade não está dado claramente no texto de lei, mas escondido nos mapas anexos. O Anexo XVII traz um mapa onde se delimitam as Áreas de Programas Especiais. São áreas com políticas especiais de uso do solo de interesse urbanístico, social, ambiental ou econômico. Ali estão delimitadas muitas áreas das quais o texto de lei não fala, o que reforça a sensação de estranhamento, já que os Anexos fazem parte da lei e serão votados pela Câmara Municipal. Mas como um vereador pede o destaque de uma linha no mapa para votação em separado?
Densidade Urbana
A quarta característica do planejamento urbano é o controle da densidade populacional, que quer dizer o número de pessoas que ocupam determinada área da cidade. Tecnicamente a densidade é definida pelo tamanho dos lotes, pela altura das construções e pelo número de pessoas que vão habitar ou frequentar aquele local. Nesse item está o ponto mais complicado da proposta apresentada pela Prefeitura de Goiânia porque dela depende a disputa pelo mercado da construção civil, que se dá de forma sub-reptícia, concedendo vantagens para os produtos das grandes construtoras sobre as outras opções de imóveis à venda no mercado, especialmente os imóveis usados e as casas construídas por centenas de pequenas construtoras.
O mercado imobiliário é limitado por condições estabelecidas pelas dinâmicas social e econômica. Quando uma família compra um imóvel para morar, ela o faz por necessidade de mais espaço, pela mudança em seu padrão de vida, pela busca de maior segurança, entre outros muitos fatores.
Seria estranho pensar que uma família pudesse manter mais do que apenas um imóvel como moradia: cada família só precisa de um domicílio. Evidentemente, existe outro tipo de comprador de imóveis, o que o faz para investir e explorar os proventos do aluguel. Ainda assim, o sucesso desse investimento depende da existência de um déficit habitacional para que hajam famílias interessadas em alugar esse imóvel; o fim acaba sendo o mesmo, o uso como residência de cada imóvel por uma única família. Portanto, a destinação dos imóveis – e podemos dizer do mercado imobiliário – não é determinada pelo investimento da incorporadora, construtora ou da imobiliária que vai comercializá-lo, mas por essa demanda socioeconômica. Pois esse mercado limitado está em disputa. Entre as opções de compra ou aluguel, encontram-se apartamentos ou casas, novos ou usados. Disputando esse mercado estão grandes construtoras de prédios de apartamentos, pequenas e médias empresas de engenharia construtoras de casas, conjuntos de geminados, pequenos prédios comunitários e também um grande número de imóveis usados: apartamentos e casas por todos os bairros.
Quando uma regra urbanística privilegia um desses concorrentes, ela cria um desequilíbrio de mercado, um protecionismo econômico. Nesse caso, o poder público provoca uma concorrência desleal que gera uma crise na cidade e um desequilíbrio que se refletirá em caos urbano.
Goiânia vive esse desequilíbrio há muitos anos. Ele foi responsável pela superdensidade nos bairros Setor Bueno, Setor Oeste e Jardim Goiás, que hoje são marcados como áreas de desaceleração de densidade exatamente por essa ocupação excessiva no passado. Por outro lado, outros bairros mais antigos, onde predominam os imóveis usados, convivem com muitas unidades abandonadas. Isso acontece por variados motivos, mas um ambiente marcado pela baixa competitividade desses imóveis diante das facilidades e incentivos conquistados pelas grandes incorporadoras – por meio de fortes lobbies mantidos junto ao poder público – para seus grandes empreendimentos é determinante para esse abandono, ainda que essa verdade esteja invisível para os proprietários desses imóveis.
A elevação dos preços dos terrenos nos últimos 15 anos é em parte um dos grandes problemas que prejudicam o desenvolvimento da cidade com justiça social e o acesso universal ao lote urbano. É necessário que a Prefeitura aja para, com planejamento, instituir políticas públicas que reduzam o preço dos lotes.
Esse instrumento é o Imposto Progressivo no Tempo, previsto no Estatuto das Cidades, que obriga a destinação ou edificação do imóvel mediante notificação do proprietário para que construa na área. Caso não o faça, a alíquota do imposto sobe progressivamente e, após cinco anos, o imóvel poderá ser desapropriado com pagamento em títulos da dívida pública. Esse dispositivo está no Estatuto das Cidades e tem objetivo de possibilitar o controle da especulação. Ele também está regulamentado no Plano Diretor de Goiânia desde a lei 171/2007, mas as notificações nunca foram enviadas aos proprietários especuladores.
Há um consenso entre urbanistas de que a densidade ideal de uma cidade estaria por volta de 250 a 500 habitantes por hectare. Isso quer dizer que para um lote médio de 360 metros quadrados, o que quer dizer que em média a cada 88,4 metros quadrados de terreno deve abrigar uma família. Digo em média porque tem famílias que ocupam casas térreas em lotes de 180, 360, 480 ou 1000 metros quadrados e tem grupos de 120 famílias que ocupam edifícios de 30 andares com 4 apartamentos por andar em um lote de 1000 metros quadrados. No caso de Goiânia, que se reflete em quase todas as cidades do Brasil, enquanto alguns bairros tem densidade inferior a 50 habitantes por hectare por causa da grande quantidade de lotes vazios ou desocupados, outros bairros têm densidades acima de 1000 habitantes por hectare, por causa do excesso de prédios construídos.
O resultado da superpopulação do bairro é a pressão sobre a infraestrutura: esgoto, energia, trânsito nas ruas, estacionamentos, redes de água tratada, falta de espaços para pequenos comércios, ambiente com excesso de poluição sonora. Algumas vantagens também podem ser percebidas pelos moradores desses bairros como maior segurança e facilidade de acesso a serviços. Idealmente a cidade deve buscar um equilíbrio evitando regiões muito adensadas e seus prédios muito altos, que ainda impactam a sua vizinhança pela perda de privacidade e pelo sombreamento da luz solar.
Uma estratégia perversa usada pelo criadores de Planos Diretores ruins é deixar buracos na Lei com a expectativa de outras leis complementares para a regulamentação de instrumentos importantes que podem ter grande impacto sobre a cidade. O Estatuto das Cidades exige um processo participativo na construção do Plano Diretor, com a obrigação de realização de audiências públicas. Esse processo não se repete na tramitação de outras leis impactantes sobre a ocupação do território e acabam por não ter o acompanhamento adequado pela sociedade nem participar do debate público na imprensa. Outro efeito dessa estratégia é dividir o veneno, quando das propostas perversas, em pequenas doses para evitar que se perceba seu sabor amargo.
Conclusão
O projeto de desenvolvimento apresentado no PL 23 para Goiânia privilegia os grandes empreendimentos e abandona o projeto de cidade de bairros aconchegantes, com casas isoladas construídas em lotes espaçosos onde há espaço para plantar árvores, fazer uma horta, brincar com as crianças, fazer confraternizações, onde as famílias se sentam nas calçadas no fim de tarde para conversar com os vizinhos.
Muitos moradores buscam a manutenção desses espaços de vida tranquila por lhes proporcionar mais qualidade de vida. Por isso, alguns bairros se mobilizaram fortemente para evitar os ataques da especulação imobiliária e das grandes construtoras, que buscam ganhar o máximo lucro no menor tempo possível com a comercialização de imóveis construídos com aproveitamento máximo dos terrenos. A cidade está em disputa e muitas pessoas não sabem e não percebem. A participação popular é uma exigência legal para o planejamento urbano, mas é também um obstáculo para o avanço das pretensões dos atores que buscam mercantilizar a cidade.
O poder público precisa estar atento a essa realidade e compreendê-la. O Planejamento Urbano, não é estático, é uma prática. O Plano Diretor é um acordo orientador, mas a cidade é construída no dia a dia. Precisamos aumentar a participação popular na construção desse acordo e no acompanhamento do desenvolvimento da cidade para que a qualidade de vida do cidadão comum seja protegida e o interesse comum contemplado. Também é importante a reconstrução do órgão de planejamento nas grandes cidades. Em Goiânia existiu um órgão assim de 1975 até 1999, o Instituto de Planejamento Municipal (Iplan).
Esse seria um órgão pensante de políticas públicas para responda às transformações constantes e cotidianas da cidade, muito diferente das Secretarias de Planejamento que exercem apenas um papel burocrático de aprovação de projetos de engenharia.
Também falta aos Planos Diretores regulamentarem a Medida Provisória 2.220/2001 que dispõe sobre o Parágrafo primeiro do artigo 183 da Constituição Federal que cria a concessão de uso especial para fins de moradia. Esse instrumento é feito para regularizar áreas de posse nas cidades com a concessão de uso de imóveis de até 250 metros quadrados localizados em áreas públicas. Esse dispositivo estaria no Estatuto das Cidades, mas foi vetado pelo Palácio do Planalto que depois de fazer ajustes publicou o dispositivo como medida provisória. Este é um dispositivo que diz respeito aos pobres, assegurando seu direito a suas posses urbanas e criando um instituto novo, concedendo não a propriedade alienável mas o direito de uso estável, com perda do imóvel em caso de “o concessionário dar ao imóvel destinação diversa da moradia para si ou sua família”e “o concessionário adquirir a propriedade ou a concessão de uso de outro imóvel urbano ou rural”. Assim esse imóvel não volta para o mercado imobiliário dando estabilidade para a política social de habitação e garantindo a moradia para as famílias possuidoras.
Conhecer o Plano Diretor é essencial para fazer um debate qualificado e garantir o melhor acordo, com as escolhas certas, para que a cidade possa ser cada vez mais bela, justa, viva, sustentável, saudável e feliz.
*Gerson Neto é comunicador, ambientalista e especialista em Planejamento Urbano e Ambiental.
Fonte: o autor
Publicação Ambiente Legal, 04/07/2021
Edição: Ana A. Alencar
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