Por Roberto Klabin e Leandra Gonçalves*
A costa brasileira – do Oiapoque ao Chuí – ainda apresenta lacunas de conhecimento, e assim como as águas internacionais, carece de um marco regulatório que possa integrar a governança costeira e marinha.
O Brasil é o segundo maior país em extensão litorânea na América Latina, com aproximadamente 10.800 km de costa. Vivem no litoral cerca de 42 milhões de pessoas, ou 25% da população brasileira, concentradas principalmente em 13 das 27 capitais situadas à beira-mar. É também no mar que estão aplicados investimentos bilionários para a produção de petróleo nas camadas pré-sal, além de diversas outras atividades econômicas. Desde a Constituição Federal de 1988, a Zona Costeira é Patrimônio Nacional.
Em 2013, cerca de 70 especialistas de diversos setores discutiram e desenharam o Projeto de Lei 6.969, chamado de “Lei do Mar”, voltado a promover o uso e a conservação marinha. Baseado em experiências de outros países, como Austrália, Canadá, Estados Unidos, Costa Rica e Noruega, o texto traz duas inovações principais.
A primeira inovação é que a “Lei do Mar” cria o bioma marinho. Hoje são reconhecidos no Brasil seis biomas: Amazônia, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa. A zona costeira e marinha é considerada um ecossistema associado aos demais biomas.
A segunda inovação é a obrigatoriedade de ser conduzido no Brasil um processo de Planejamento Espacial Marinho (PEM), a exemplo do que vem sendo feito em outros lugares do mundo.
Em agosto, o projeto de lei foi aprovado na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados e seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes de ser encaminhado ao plenário. Esse processo de tramitação representa uma grande oportunidade para os parlamentares se envolverem e se comprometerem com a zona costeira e marinha, que por sua importância contribui com o sustento de mais de 1 milhão de pescadores, com o desenvolvimento de diversas atividades produtivas, e, ainda, com serviços ecossistêmicos que garantem qualidade de vida e bem-estar humano.
Para colaborar com essa missão, a Fundação SOS Mata Atlântica, junto ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), realizou um mapeamento inédito que avaliou de forma detalhada as diferentes fitofisionomias e ecossistemas costeiros nos 14 estados litorâneos no domínio da Mata Atlântica. Foram consideradas áreas naturais, dunas, banhados e várzeas, entre outros ecossistemas costeiros, e aquelas ocupadas por atividades como carcinicultura e salinas. Os resultados apontam, por exemplo, que o Rio de Janeiro se destaca por manter 12.121 hectares (ha) hectares de manguezais e 53.042 ha de restinga ainda bastante preservados.
A proposta é que essa iniciativa seja um “marco zero” para o monitoramento desses ambientes, permitindo que a sociedade acompanhe mais de perto e intensifique as ações para o desenvolvimento regional aliado à conservação desses ambientes.
O desafio é enorme e envolve agregar interesses de diversos setores e instituições. É ainda maior na medida em que deve colocar o mar como um bem-comum, onde a harmonização de seus usos é do interesse de todos, e, portanto, precisa ser feito de forma participativa e democrática. Olhar para nossa costa e mar, e conhece-los, é o primeiro passo.
*Roberto Klabin é vice-presidente da Fundação SOS Mata Atlântica para a área de Mar; Leandra Gonçalves é bióloga e consultora da organização. A SOS Mata Atlântica é uma ONG brasileira que atua há 30 anos na defesa da floresta mais ameaçada do Brasil. Saiba como apoiar as ações da Fundação em www.sosma.org.br/apoie.
Fonte: SOSMA