Parte 1: O inimigo, o Teatro de Operações, a Frente da Organização do Estado e o Primeiro Alvo – o Presidencialismo de Coalização
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro*
A eleição de Jair Bolsonaro representa a primeira vitória de uma longa série de batalhas, na assimétrica e multifacetada guerra que travará contra o establishment.
No teatro de operações brasileiro, a vitória pelo voto autorizou o embarque da tropa escolhida pelo povo. Essa tropa de escolhidos comandada pelo eleito deverá se organizar, navegar nas brumas da articulação, do planejamento, e desembarcar no Palácio do Planalto, quando da posse, sempre sob o fogo intenso e cerrado dos parasitas da pátria.
O objetivo deste artigo, e de outros que se seguirão nos próximos dias, neste Blog, é compreender a natureza e a extensão das frentes de batalha que se avizinham. Abordaremos o que demandará atenção nos primeiros momentos da formação da “cabeça de ponte” de Jair Bolsonaro, para consolidar a posição obtida nas urnas, na cidadela de Brasília tomada ao inimigo.
O inimigo: o establishment
Jair Bolsonaro venceu a primeira batalha de uma longa guerra que ainda terá que travar contra o establishment que domina o Brasil.
O establishment brasileiro não guarda compromissos com a Nação. Porém, a teme. Teme o povo e a democracia. Antevendo a perda de posições desde o final da década passada, após a quebra de mercado de 2008 (a “marolinha” do Lula, que nos banha até hoje), o establishment tratou de permanecer também entranhado no “deep state” – o Estado Profundo, de onde emite sinais trocados para não ser desalojado. Enquanto isso, cedeu boa parte de seu capital político e financeiro aos interesses internacionais, evadiu divisas enquanto desindustrializava e descapitalizava o Brasil, acobertado por uma jusburocracia invasiva e deletéria para a economia nacional – que gera conflitos ao invés de resolvê-los.
As eleições revelaram um país perigosamente dividido. Mais que isso… sitiado! Estado e sociedade tornaram-se reféns de criaturas instaladas nos meandros de nosso organismo social. Rentistas e globalistas, populistas e oportunistas, corruptos privilegiados e criminosos comuns, ativistas, desagregadores e liberticidas culturais, infestaram nosso cotidiano.
A parasitagem não é circunstancial. Contaminou cientificamente os meios culturais, escolas e universidades. Inoculada nas minorias rancorosas, a desagregação segrega e estimula o ódio. Destrói a secular miscigenação que forjou a generosidade de nosso caráter. O objetivo do establishment é destruir a comunhão nacional.
O Teatro de Operações
Diante da encruzilhada, entre a mesmice e a renovação, impõe-se uma escolha de caminho firme e definitiva.
Bolsonaro não foi eleito para trilhar a direção da mesmice. Necessariamente deverá seguir a via da renovação. Com isso, irá enfrentar uma guerra assimétrica desenvolvida em várias frentes, contra inimigos disformes e dissimulados.
No lodaçal produzido pelo establishment, encontra-se a República e, com ela, instituições que deveriam expressar a soberania popular e conferir legitimidade ao Poder Público.
A expressão da soberania popular, subjugada por regras mal feitas, emendadas e interpretadas casuisticamente por um Poder Público sem qualquer legitimidade, suplantou as amarras e determinou a renovação.
Jair Bolsonaro é um corolário objetivo de um processo político de perda de legitimidade do Estado, que antecede sua candidatura.
A perda da legitimidade do Poder Público tornou-se inconteste em 2013, quando explodiram gigantescas manifestações assertivas, que revelaram o descrédito popular nas autoridades constituídas. Ficou evidente o profundo descontentamento do cidadão com o funcionamento, a representação e a organização do sistema político.
O quadro, desde então, só piorou, evidenciando o parasitismo do Estado em relação à população que o sustenta, massacrada por uma enorme concentração econômica.
O desastre econômico do governo de Dilma Rousseff agravou ainda mais a situação, jogando milhões de brasileiros na vala comum da desesperança. O que torna o teatro de operações ainda mais dramático para o presidente eleito.
A primeira frente a ser enfrentada, assim, é a da própria organização do Estado.
A Frente da Organização do Estado
A arma principal nesta frente de batalha é a soberania popular, representada pelo Congresso Nacional.
O novo Congresso, sufragado nas eleições de 2018, tem plenas condições para apoiar as mudanças necessárias. Para tanto é necessário suplantar o diálogo limitado às lideranças dos partidos. Uma boa estratégia é dialogar com as frentes parlamentares temáticas, já existentes no Congresso Nacional.
A adoção dessa providência é sanitária. A Operação Lava-Jato evidenciou a relação promíscua dos partidos com os fornecedores de bens e serviços ao Estado. Denunciada esta relação como fonte geradora de corrupção pela sociedade e seus organismos de controle, os partidos abandonaram o financiamento privado das campanhas para adotarem o financiamento público. A ideia, no entanto, era usar a verba extraída do contribuinte, para que tudo permanecesse na mesma, sem investir na renovação.
O povo brasileiro soube, porém, identificar a articulação em prol da mesmice, de tal forma que votou em peso pela renovação do parlamento em 2018, aposentando líderes que se julgavam imovíveis e exterminando a carreira política de famílias tradicionais no meio. O povo fragilizou, assim, as lideranças partidárias.
O novo parlamento é fruto dessa dura mudança e portador do duro recado das urnas. Terá, portanto, a obrigação de implementar uma profunda reforma política. Também deverá apoiar as ações do governo Bolsonaro contra as várias frentes que contra ele já se erguem.
A tetraplegia da Administração Pública, ocasionada pela judicialização que ameaça seus atos e quadros, é outra preocupação.
O núcleo de parasitas inoculados no deep state, por óbvio não está disposto a “largar o osso”. Após ser obrigado a reformar a economia em 1995, o grupamento esquerdizóide inoculado no establishment e alinhado com o projeto da Nova Ordem Mundial, tratou de implementar um processo de perda gradativa das liberdades civis e de controle burocrático das relações econômicas, comprometido com a relativização da soberania. Não por outro motivo, hoje, a jusburocracia estatal “diverte-se” criminalizando condutas do cidadão e judicializando a Administração Pública, enquanto busca controlar as atividades econômicas relacionadas ao Estado, elegendo três ou mais organismos de controle para cada um de execução.
A jusburocracia é a face dura do establishment e precisa ter sua funcionalidade resgatada para o Estado. O Congresso Nacional será, portanto, decisivo para as mudanças que virão.
a) O primeiro alvo: o presidencialismo de coalização
Desde logo, mesmo antes da posse, será preciso fazer a lição de casa para decidir como eliminar o nefasto presidencialismo de coalização.
As lideranças que sobreviveram à onda de renovação, passado o primeiro turno das eleições, já trabalham para extrair do próximo governo o mesmo arco de alianças incrustado no Estado desde o advento da Nova República. O mesmo arco de alianças que escolheu José Sarney, sofreu um revés com Collor, recuperou-se com Itamar, elegeu FHC, Lula e Dilma, e recompôs-se com Temer.
O presidencialismo de coalização desfigurou a democracia. Entronizou o crime organizado da estrutura de poder, pulverizou mensalinhos parlamentares que extrapolaram o Congresso Nacional, instalando-se em praticamente todas as câmaras municipais e assembleias. O PC distorceu contratações de bens e serviços na Administração Pública, judicializou a gestão pública, reduziu a capacidade de investimento do Estado e drenou os cofres públicos para pagamento de pessoal,
O presidencialismo de coalização, camuflou o projeto hegemônico Gramscista, a formação do bloco histórico encetado pelo arco de alianças esquerdo-populista, liderado pelos dois lados da mesma moeda: PSDB e PT, e seus satélites partidários. Esse arco de alianças teria sufocado o Estado Democrático de Direito, não fosse o abalo sofrido com as manifestações populares a partir de 2013, o impeachment de Dilma Rousseff e o avanço das investigações policiais no combate à corrupção, originadas a partir da Operação Lava-Jato.
A nova bancada do Congresso Nacional não pode tolerar essa mesmice, muito menos se intimidar. Deverá combater o presidencialismo de coalização, e a grande arma para tal será a verdade e a transparência.
Alterar o diálogo buscando concentrá-lo temática e proativamente nas frentes parlamentares poderá reduzir o papel de figuras lamentáveis, como o dito “centrão”, deslocando-o para um protagonismo secundário no campo das articulações pelas reformas de estado, em especial no momento da verdadeira reforma política.
Continua…
*Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor. É sócio-fundador do escritório Pinheiro Pedro Advogados e diretor da AICA – Agência de Inteligência Corporativa e Ambiental. É Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB, Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa – API, Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal, do Mural Eletrônico DAZIBAO e responsável pelo blog The Eagle View.
Fonte: The Eagle View