Reforma no comércio europeu de emissões restringe participação do Brasil
Por Danielle Denny
O Parlamento Europeu aprovou a possibilidade de reforma do Sistema de Comércio de Emissões (ETS, na sigla em inglês). A alteração tinha sido rechaçada no começo do ano, para evitar restringir ainda mais a já combalida economia europeia. A medida consiste em suspender até 2020 a circulação de 900 milhões de certificados, que funcionam como licenças para emissão de gases de efeito estufa (GEEs).
O ETS europeu funciona no esquema cap-and-trade (teto e negócio), no qual empresas que emitem GEEs além do limite compram certificados das que adotaram tecnologias mais limpas e ficaram aquém das metas. Projetos de países de fora do Anexo I do Protocolo de Kyoto, ou seja, sem metas obrigatórias de redução, entram no esquema por meio de certificados decorrentes do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL).
Para evitar o desemprego causado pela crise econômica que assola o continente, foi aplicada a desoneração da indústria, assim, muitas receberam gratuitamente direitos de emissão de GEEs. Tal medida inundou o mercado de carbono com títulos e contribuiu ainda mais para a queda dos preços já baixos em virtude do impasse das negociações sobre o clima no âmbito internacional. O valor da tonelada de CO2, calculado pela Comissão Europeia, que era de 30 euros em 2007, atualmente, não passa de 5.
Com esse nível de preço, a inovação tecnológica deixa de valer a pena e as usinas termelétricas a carvão mineral ficam mais rentáveis. O texto aprovado em abril deste ano tenta conciliar a parte econômica, política e ambiental da disputa, restaurando o incentivo a um comportamento ecológico sem sobrecarregar excessivamente a economia, acredita Dirk Forrister, Presidente da Associação Internacional de Comércio de Emissões (IETA na sigla em inglês). “Ainda é um começo, já que os Estados membros precisam aprovar a decisão do Parlamento, mas representa uma mudança política e pode resultar numa reforma estrutural do sistema”, afirma.
Do ponto de vista brasileiro, não há motivo para comemoração. A secretária executiva do Programa de Defesa contra Mudanças Climáticas do Estado de São Paulo (Proclima), Josilene Ferrer, ressalta que já desde as novas regras previstas para a atual terceira fase do ETS, “acabaram a possibilidade de serem reconhecidos como MDL projetos novos no Brasil e nas grandes economias dos países não Anexo I. Apenas os registrados até dezembro de 2012 serão aceitos no ETS da Europa, e ainda assim, se tiver comprador interessado. Daqui para frente a Europa quer comprar MDL só dos países menos desenvolvidos”.
Por outro lado, Sarah Deblock, Diretora de Política Europeia da IETA, estima que os impactos de uma possível reforma, serão mínimos para o Brasil e ainda vão demorar. “A decisão do Parlamento foi informal e passará pela análise do Conselho Europeu, depois os dois órgãos vão se posicionar definitivamente, mas isso deve ocorrer em novembro”, calcula. Até agora houve apenas um esclarecimento sobre a possibilidade jurídica de ser suspensa a circulação dessas licenças frente à Diretiva do ETS, se o Parlamento e o Conselho Europeu concordarem com essa interpretação, o Comitê de Mudanças Climáticas, formado por especialistas dos 28 Estados Membros, será o órgão a votar a proposta de reforma em si que deve começar a surtir efeitos em meados de 2014, segundo previsões.
Para Anibal Wanderley, da Capital Ambiental, como o MDL vindo do Brasil após 2012, não é mais admitido na Europa, esse enxugamento de liquidez no ETS terá mesmo pouco impacto no mercado brasileiro. E mesmo o resto do mundo discute a efetividade das medidas, “enquanto o carbono não tiver um preço estável o mercado continuará morto e não é só a crise que faz isso, tem que criar uma taxa carbono pagável com os créditos, incidente sobre os produtos nacionais e importados, mas, para tanto, teria de haver uma estrutura internacional para inventariar e outra para auditar a pegada de carbono. É uma posição muito fácil de defender, porém muito difícil de implementar”, acredita o especialista.
Do ponto de vista macroeconômico e internacional, avanços na área de mudanças climáticas são bem vindos. “Qualquer movimento no sentido de elevar o valor do carbono em qualquer mercado é benéfico para a redução das emissões globais, assim, a medida específica [aprovada em 3 de julho de 2013] é positiva, apesar de tímida”, avalia Ricardo Gustav Neuding da ATA Ativos Ambientais.
O Protocolo de Kyoto e o MDL
O Protocolo de Kyoto complementa as diretrizes políticas estabelecidas na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), firmada durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, ocorrida no Rio de Janeiro, também conhecida como ECO92.
O tratado estabelece metas quantitativas de limitação e redução de emissões de gases de efeito estufa por parte dos países industrializados (signatários do Anexo 1), os quais assumiram sua responsabilidade histórica pelo problema do aquecimento global. Assim, se responsabilizaram a, no período de 2008 a 2012, reduzir suas emissões agregadas de gases de efeito estufa em 5% em relação aos níveis verificados em 1990, adotando medidas internas, como a alteração de padrões de produção e consumo, ou por meio de dispositivos de cooperação internacional, dentre os quais o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL).
O MDL deriva de uma proposta criada pela diplomacia brasileira e prevê a possibilidade de países industrializados cumprirem parte de suas metas por meio de financiamento de projetos em países em desenvolvimento que reduzam as emissões agregadas de gases de efeito estufa, contribuindo, assim, ao mesmo tempo, para o cumprimento das metas obrigatórias do Protocolo e para o desenvolvimento sustentável nos países de fora do Anexo 1.
A validade do tratado foi prorrogado na 18ª Conferência das Partes da UNFCCC (COP18) em Doha, no Qatar e é esperado um novo acordo global juridicamente vinculativo em 2015.
Matéria bem relevantes, só ficou faltando informar a data de publicação. :/