Reduzir a maioridade é inócuo e o sistema penal brasileiro está insustentável
Por Danielle Denny exclusivo para Ambiente Legal
A redução da maioridade penal é alardeada por muitos como o bastião da justiça que irá redimir todos os crimes e injustiças.
Na verdade enfrentamos um problema sistêmico muito mais grave, que para ser resolvido precisaria de uma completa revolução de valores.
Esse problema envolve rediscutir os limites da própria mídia, segundo os participantes de debate sobre a questão, havido na Casa do Saber, em São Paulo.
“Estamos construindo o país com prisões não com escolas”
(Antonio Claudio Mariz de Oliveira)
O Brasil está impregnado de cultura punitiva.
“É o lado selvagem do ser humano que se ufana da punição, que aplaude a prisão, regozija com o castigo”; assim identifica Antonio Claudio Mariz de Oliveira, renomado advogado criminalista e ex Secretário de Justiça e de Segurança Pública do Estado de São Paulo. Ele participou de um interessante debate sobre o assunto, realizado na Casa do Saber, em São Paulo.
É fato que a imprensa tira vantagem dessa selvageria inata. Programas que fazem a cobertura de violência urbana, crimes e desastres são líderes de audiência. Detalhes sórdidos como um braço de uma criança devorado por um animal selvagem são veiculados em rede nacional e isso não gera estranheza para a sociedade.
Em países como Inglaterra e França há regulamentação a respeito do que pode ser noticiado, sem violar o direito à imagem dos envolvidos. Lá, não se pode divulgar o nome nem a imagem do criminoso enquanto ele não houver sido julgado. “Isso para evitar a punição do meramente suspeito de algo, ferindo o principio da legalidade”, ensina Pierre Moreau, advogado, professor e sócio do escritório Moreau Advogados.
A execração pública corresponde à capacidade punitiva da imprensa. Mariz e Pierre concordam que isso precisa ser regulamentado. De preferência pela própria imprensa, criando um órgão de classe como existe na publicidade, que seja capaz de autorregulamentar, examinar eventuais abusos, realizar um processo administrativo em que haja defesa, para só então emitir pareceres.
Mariz pondera que, quanto mais distante o Estado estiver nesse aspecto, melhor. Pois qualquer iniciativa pública pode resvalar em censura.
Porém, se não houver autorregulamentação, mesmo sob esse risco, é melhor que haja regulamentação estatal. “Do jeito que está não pode continuar” ressalta Mariz de Oliveira.
A conclusão é que a condenação pela mídia vai muito além da culpa.
A importância de um código de conduta, que recomende como noticiar violência urbana, crimes e desastres, é especialmente maior nos casos penais. “Veiculação de um crime num jornal nacional é como se fosse uma prisão perpétua, que no Brasil é proibida” polemiza Mariz.
Com os meios digitais, e a respectiva dificuldade de retirar um conteúdo da Internet, o problema se agrava ainda mais.
Nesse sentido mandar menores de dezoito anos para a carceragem pouco resolverá o problema da segurança pública. Quanto menor for o infrator, mais desprovido de inibição moral será, principalmente aqueles que são relegados ao abandono.
“Estamos construindo um país com prisões, não com escolas”, alerta Mariz. Com isso, apenas se reforça a lógica de poder do crime organizado, que se funda no aliciamento dos renegados pelo Estado.
Sendo assim, para que o sistema prisional brasileiro fosse realmente melhor, deveria haver uma profunda alteração nos valores éticos da sociedade.
Condenações seriam tão bem vistas, como as absolvições. Afinal o objetivo é conseguir a justiça.
Danielle Denny é jornalista e advogada, colunista do Portal Ambiente Legal
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