
O período eleitoral é pródigo em várias coisas.
Sobretudo, é pedagógico! Oportunidade para comparar a prática com discursos e propostas.
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
No campo ambiental, as próximas eleições vão explicitar quem tem propostas reais e quem se limita a discursos poéticos ou práticas fora de sintonia com a nova ética do planeta. Não é possível lidar com os novos desafios da tecnologia, da exclusão social, da economia globalizada e da ampliação global da degradação ambiental com políticos e estruturas partidárias que pouco ou nada estão preparados para o enfrentamento destas questões. As ferramentas são outras.
O administrador moderno, politicamente engajado, deve saber lidar com os instrumentos do chamado ambiente de regulação, deve administrar as demandas da participação popular na gestão pública, deve conciliar seu programa de governo com os interesses difusos identificados na sociedade – como os das minorias, o da busca pela qualidade de vida seja lá o que isso possa significar para cada indivíduo.
O político moderno, antes de tudo, precisa ser um negociador, voltado para a solução de conflitos e desprovido de projetos de poder hegemônicos que, como sabemos, contaminaram o ambiente político do século 20, resultando em totalitarismo, miséria e retrocessos.
A sociedade brasileira está indubitavelmente mais consciente e atenta à questão ambiental e aos contrastes sociais de nossa economia. Isso tem levado setores produtivos a implementar ações de responsabilidade social, não só como marketing, mas para atender às exigências do mercado consumidor.
Vivemos em um ambiente globalizado, onde não só o comércio, mas a informação e a sociedade civil são mundiais e os grandes blocos econômicos constroem sistemas crescentes de exigências de ordem ambiental e social, impostas como verdadeiras barreiras comerciais, que devemos enfrentar armados com sistemas gerenciais mais limpos.
Temos de diminuir a pobreza, definir parâmetros da Nova Economia e preservar o meio ambiente, em especial a água, um bem vital.
Fala-se muito na criação de emprego. Candidatos citam Getúlio Vargas, mostram as carteirinhas azuis. Perdoem-nos o trocadilho, mas a Nova Economia mundial aposentou essa questão.
Tony Blair, o primeiro-ministro britânico, já declarou que o rock and roll gera mais divisas ao seu país que o setor industrial. Só os “desplugados” estranharam a afirmação de Blair.
Não temos, infelizmente, Rolling Stones por aqui, mas, se bem implantadas, as indústrias do entretenimento e do turismo, que constituem hoje a pedra de toque do mercado norte-americano, são capazes de fazer mais pelos brasileiros que montadoras de carros (que, aliás, estão fechando por lá…).
Na falta de Jagger, fazendo referência aos roqueiros e a Blair, São Paulo, em compensação, tem de tudo um pouco. Tem campo, praias, espaço para eventos de negócios. E, inacreditavelmente, o turismo continua a crescer sem planejamento e sempre aquém do que poderia. As ramificações do turismo produzem mais Trabalho e Renda, no curto prazo, que qualquer outra atividade poderia fazê-lo.
Não é só isso.
O Estado de São Paulo já é um mundo. Sozinho, figura entre as maiores economias do planeta. Abriga três regiões metropolitanas de peso: a de São Paulo, a de Campinas e a de Santos. Possui três outros Pólos Regionais de porte: Sorocaba, São José dos Campos e Ribeirão Preto.
Nosso setor agrícola é referência para a América do Sul e para o resto do país. O eixo de conurbação do Vale do Paraíba liga a capital do Estado ao Rio de Janeiro em meio a um mosaico industrial de fazer inveja a qualquer potência do globo. Muito bem, e o que fazer?
A função precípua do governador do Estado é conduzir a Administração Pública, administrar e resolver os conflitos, implementar planos, políticas e programas de desenvolvimento. Dentro de um amplo Sistema de Regulação, cada vez mais integrado com a União Federal e com organismos multilaterais, compete ao governador coordenar a mais importante atividade do Estado, que é o planejamento.
A esmagadora maioria dos paulistas vive em cidades. Então: como gerar oportunidades de Trabalho e Renda sem uma regularização urbana profunda, sistemática e abrangente?
Hoje, para comprar uma máquina de costura ou algum pequeno equipamento que venha a lhe assegurar Trabalho e Renda, o candidato a um empréstimo no chamado Banco do Povo precisa dar aval ou indicar alguém que o dê.
Todos sabemos que mais de 20% da população paulista mora de forma irregular e, certamente, a quase totalidade da população pobre e miserável do Estado vive em imóveis irregulares, sem título, sem escritura ou qualquer outro documento que comprove posse ou propriedade. Assim, nem mesmo um empréstimo no Banco do Povo a população carente de São Paulo pode fazer.
O Estatuto da Cidade, lei federal de máxima importância para a chamada reforma urbana, ainda esbarra em sua implementação, com conflitos de competência entre Estados e Municípios na aplicação de vários de seus instrumentos, como o chamado licenciamento ambiental para regularização de áreas de interesse ecológico, invariavelmente ocupadas pela população de baixa renda. Não há um efetivo apoio do Estado para que os municípios implementem seus planos diretores.
Sem resolução no sistema fundiário, não há como enfrentar, estruturalmente, os efeitos degradadores da miséria urbana. A falta de segurança é um desses efeitos. E pode reverter-se em um bom exemplo de atuação estrutural, mais eficaz, que o triste espetáculo de desaforos e discursos demagógicos que observamos hoje.
A violência em nossas cidades é, precipuamente, gerada nos bolsões de pobreza e deles se expande. O aumento estrambólico de gastos com material bélico e pessoal fardado, embora renda ótimos desfiles para inauguração de viaturas, não resolve o cerne da questão, que é o resgate da cidadania nessas áreas ambiental e fundiariamente degradadas. Temos a convicção que a melhor Polícia de Estado é a vizinhança.
Quem já experimentou o sabor da cidadania não fica sem ela. Cidadãos com endereços certos, vivendo em propriedades e áreas regularizadas, contando com coleta de lixo, abastecimento de água e luz, serviços de esgoto e possuindo condições de chamar uma ambulância sem precisar deslocar-se para um logradouro oficial, serão os primeiros a se mobilizar para acabar com a violência.
Deixam de morar em “comunidades” (nome politicamente correto de favelas ou assentamentos irregulares) e passam a morar em BAIRROS, os organismos que constituem a cidade. É lógico que, assim, passam a contar com o apoio de nossa polícia, que passará a patrulhar a área e não policiá-la.
A polícia tem de estar presente, mais aparelhada e mais inteligente, mas articulada com centros de apoio integrados por forças-tarefa que incluam o Poder Judiciário e o Ministério Público, para resolução de conflitos urbanos de pequena monta e agilização das investigações envolvendo bandos e quadrilhas que se assenhoram dessas “áreas dominadas”, resgatando-as, portanto, para a cidadania.
Não se pode mais construir um futuro sustentável para nossa sociedade com procedimentos cujo passado os condena e o presente pena em cumprir.
O desenvolvimento do turismo, assim como o desentrave para o agronegócio sustentável, dependem de um processo de planejamento e ordenamento territorial vigoroso, esforço diretamente proporcional a um trabalho de revisão e racionalização de normas ambientais hoje inaplicáveis. Tudo isso, é lógico, conectado com a urgente modernização de nossa infra-estrutura.
Esse campo urge ser abordado com vigor e vontade política, observando os gargalos ambientais apostos equivocadamente pelos entes burocráticos, que desmoralizam nossa legislação e tornam insustentável nosso desenvolvimento – a pretexto de “corrigi-lo”.
Esses entraves podem e devem ser combatidos a partir de nosso Estado.
A legislação ambiental hoje em vigor no país, e especialmente no Estado de São Paulo, embora constitua política pública das mais louváveis, perde-se em um emaranhado de regulamentos, produzidos pelas mais diferentes esferas de poder, em vários entes federados, tornando-se entrave ao desenvolvimento econômico e não um efetivo suporte para conferir-lhe sustentabilidade.
O interesse público prevalente na proteção dos recursos ambientais induz maior controle social nas atividades industriais potencialmente poluidoras, mega-tendência cuja progressão não se pode mais ignorar.
A necessária adequação da legislação em vigor ao processo produtivo sustentável, por meio do conceito de “produção mais limpa”, adotado pelo mercado e só agora assimilado pelo poder público, não se fará, porém, com imposição e teses acadêmicas traduzidas em diplomas legais de eficácia duvidosa. Pelo contrário, deve ter em vista a realidade atual do sistema de controle ambiental do nosso país, repleto de indefinições de ordem estrutural, mal equipado e capacitado.
Todos nós, mortais, sonhamos, mas há pessoas cujos sonhos podem induzir a máquina burocrática a editá-los, transferindo-os para a realidade e o cotidiano dos outros mortais…
Daí a importância de elegermos representantes que possam lançar sobre o Estado de São Paulo um olhar mais “verde”, porém maduro.
* Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado e consultor ambiental. É sócio-diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados e membro da Câmara Internacional de Comércio e da Câmara Americana de Comércio. É diretor da Associação Brasileira dos Advogados Ambientalistas. Foi secretário de Meio Ambiente do município de São Paulo.