Por Danilo Vital
Não é possível invocar os princípios da proporcionalidade, razoabilidade e finalidade para conferir permissão para que um clube construído em área de preservação permanente (APP) continue a ser usado por seus sócios. A construção pode e deve ser demolida para reabilitar o meio-ambiente.
Com esse entendimento, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reconheceu a inviabilidade de manter em funcionamento um clube em Paulicéia (SP), construído à margem do reservatório de uma usina hidrelétrica.
Nas APPs, a cobertura vegetal deve ser mantida para garantir a proteção do solo, dos recursos hídricos e a estabilidade do relevo, de modo a evitar o assoreamento e assegurar a proteção de animais e vegetais.
Em Paulicéia, em vez disso construiu-se nove blocos de apartamentos, piscina, capela, restaurante, salão de jogos e outras edificações, com instalação de rede de distribuição de energia elétrica e coleta seletiva de lixo. O clube, também uma colônia de férias, é frequentado por 9 mil sócios.
Por isso, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região entendeu que a ordem de demolição desconsiderou os princípios da proporcionalidade, razoabilidade e finalidade. “A adoção de outras medidas ambientais protetivas já se mostraria providência suficiente e adequada para a recuperação e conservação da área”, diz o acórdão.
O Ibama e o Ministério Público Federal recorreram ao STJ, apontando que a urbanização de uma área construída ilegalmente não consta entre as justificativas legais para manter as edificações.
Relator, o ministro Og Fernandes identificou no acórdão do TRF-3 uma tentativa implícita de aplicar a teoria do fato consumado em causa ambiental, algo que é vedado expressamente pela Súmula 613 do STJ.
A teoria do fato consumado indica que as situações jurídicas consolidadas pelo decurso do tempo não devem ser desconstituídas, em razão do princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais.
“A compreensão de que a demolição causaria mais danos que a manutenção do edifício ilicitamente erigido em APP configura-se mero pretexto para manufaturar distinção jurídica inadmissível”, afirmou o relator.
Para ele, a única hipótese de aplicação dessa tese seria a de abandono do local, para deixar a natureza tomar seu curso e retomar a área. Seria o caso, por exemplo, de uma construção em uma falésia, cuja demolição causasse risco de desmoronamento.
“Nada disso se confunde com a construção intelectual da origem, que não apenas veda a demolição como autoriza a permanência do imóvel, em pleno uso. Esta última medida é que é inaceitável e configura-se como verdadeira burla à jurisprudência vinculante desta Corte consolidada no enunciado supracitado”, criticou o ministro Og. A votação foi unânime.
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REsp 1.983.214
Fonte: ConJur
Publicação Ambiente Legal, 24/07/2022
Edição: Ana Alves Alencar
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