Por Ana Alves Alencar e Antonio Fernando Pinheiro Pedro
Há muito já se fala que as guerras num futuro próximo serão pela água.
A ONU prevê que oitenta países entrarão em conflito armado em função desse recurso precioso nos próximos anos.
Aqui no Brasil, o que parecia improvável já começou: uma guerra interna, entre unidades da federação, por conta do uso da água – e o motivo não é apenas a escassez, mas, sobretudo, a incúria e a incompetência gerencial dos governos envolvidos.
A região Sudeste sofre, nos últimos meses, com a falta de água nos reservatórios que abastecem suas cidades. São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, já estão disputando pelo uso da água de seus principais rios.
Com o reservatório da Cantareira funcionando abaixo do nível mínimo, sem previsões positivas de aumento de sua capacidade a curto prazo, o governador paulista, Geraldo Alckmim, propôs o desvio das águas da Represa Jaguari (Bacia do Paraíba do Sul), para dar suporte ao reservatório da Cantareira (Transposição da Bacia do Piracicaba para a Bacia do Tietê). A proposta foi ferozmente rebatida pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, porque o Jaguari é afluente do Rio Paraíba do Sul, que abastece quase que a totalidade do Estado do Rio.
Cabral chegou a dizer que “jamais cederá um milímetro”. Alckmin respondeu que o rio “é paulista”.
O diretor da ANA, Vicente Andreu, disse que Alckmin e Cabral, precisam sentar e conversar, a fim de evitar uma “guerra das águas” desnecessária e improdutiva em ano eleitoral . De fato, a batalha não trará nenhum beneficio à população dos dois estados.
O Rio Paraíba do Sul nasce em São Paulo, segue por Minas Gerais e Rio de Janeiro, abastecendo os reservatórios de cidades por onde passa. Legalmente, a ANA- Agência Nacionais das Águas, é responsável pela gestão de captação de águas dos rios federais . No entanto, o governador de São Paulo não precisa do aval da Agência para projetar e implantar o uso das águas do Paraíba do Sul, embora se sujeite à outorga e regime de reservação da Agência, como condição para implementar o sistema.
O projeto de transposição das águas do Rio Paraiba do Sul para o Sistema Cantareira não é recente, já vem sendo discutido desde 2008. Porém, como a situação estava aparentemente confortável, o governo paulista não deu andamento a ele. Uma inércia que hoje mais pareceu uma incúria.
È preciso considerar que um projeto desse porte duraria meses, talvez anos, para ser implementado, pois trata-se de rio federal, sujeito a outorga e reservação autorizada da ANA, demanda licenciamento ambiental do IBAMA, manifestação dos Comitês de Bacia interessados, e oitiva dos estados afetados pelos impactos do projeto. Isso leva tempo.
Muitas nascentes que abastecem a bacia estão em situação de risco, como a nascente do próprio Rio Paraiba do Sul, situada no município de Cunha, que já vem dando sinais de diminuição do nível de água devido a falta de chuva que atinge a região.
Como o problema do reservatório da Cantareira exige alternativas imediatas, ainda tem muita água pra passar por debaixo da ponte nessa disputa entre os governos paulista e carioca.
Apesar do Brasil ser o país com a maior volume de água doce superficial do mundo (12% do total mundial, e 20% da água potável), a má gestão dos recursos hídricos, a poluição dos rios, a falta de proteção das nascentes e o desperdício de quase 45% de água tratada em todo o país, nas redes de distribuição e reservação, nos legou á beira de uma grande crise de abastecimento de água de consumo e, de uma provável “guerra” pela água entre os estados. da federação.
A legislação não pode ser culpada, porque é abundante e comprovadamente aficaz. O que não funciona é a Administração Pública que deveria implementá-la.
A falta de engajamento dos atores envolvidos, desde os órgãos de planejamento, gestão, controle e fiscalização, até os sistemas de abastecimento e saneamento, fiscalização ambiental, órgãos de proteção dos consumidores, organismos de tutela judicial, é uma constante.
A incúria no tratamento da questão, literalmente nos fizeram chegar a todos no fundo dos poços (e reservatórios).
Se persistirem o impasse e a demagogia nessa “guerra” anunciada pela água na Região Sudeste, a saída será a busca por uma tutela judicial federal… e com ela, a redução da busca pela solução material do abastecimento da população ao ritmo absurdamente lento dos processos judiciais.
Que São Pedro possa realmente intervir, para nos livrar do Poder Público que nos (des)governa nessa parte do globo.
Torcer para que a aparente e talvez recente desregulação climática traga o período de chuvas para o outono, inverno e primavera, já que as águas de março não vieram. No entanto, o constante desmatamento e urbanização amazônica, assim como as megas ilhas de calor que existem em SP, RJ e MG, indicam que os problemas no Sudeste podem ser ainda mais agravados. A alteração constante no ecossistema e sua consequente mudança de comportamento climático, criando, entre outros, um problema de falta de água doce e potável, pode provocar uma série de alternativas inusitadas, como a dessalinização. Será?
É um absurdo esse confronto desnecessário, pois a legislação determina os direitos´hídricos nesse caso de limites fronteiriços. É apenas ter a ética e o bom senso de cumprir a lei e a comissão das bacias hidrográficas reunir com os 2 gestores estaduais e chegar ao consenso das partes…respeito à legislação e mais nada..e a ana qual seu papel nesse contexto, não tem voz? Onde está os princípios democráticos nessa hora? Será necessário derramar sangue inocente por causa de algo tão simples de resolver…bom senso..bom senso e mais nada!ABRAÇOS AS TODOS!
“Se as guerras deste século XX foram causadas pelo controle do petróleo, as guerras do próximo século XXI serão travadas pelo acesso à água”.
Ismail Serageldin, Vice Presidente do Banco Mundial (1995).
Profecia? R: Não. Um posicionamento racional manifestado há quase 20 anos … e ainda, nesse tempo transcorrido desde aquela data, a sociedade não saiu de sua “zona” de conforto, evidenciada em seu comportamento de consumidor predatório a modificar seu padrão de relação com a “natureza”.
Toda esta problemática tem solução com o plano de gestão eficiente, que permita coadunar o gerenciamento dos recursos hídricos com os diversos usos a que são destinados. A transposição do Paraíba do Sul para o Sistema Cantareira deverá obedecer necessariamente a legislação federal sobre recursos hídricos e deverá contemplar os diversos destinatários a jusante a captação por meio de plano de bacia realizado em conjunto, de modo a não inviabilizar o sistema que, desde muito, é fundamental para o abastecimento de toda a região metropolitana do Rio de Janeiro que depende da captação do Paraíba do Sul pelo sistema Guandu para ter água, bem como não poderá impactar os demais usuários a jusante. É necessário que se implemente a cobrança pelo uso da água para viabilizar a gestão compartilhada que é uma possível solução para resolver o conflito.